São Paulo, segunda-feira, 04 de abril de 2011

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Luta diária para os filhos de migrantes

Por PATRICIA LEIGH BROWN
SALINAS, Califórnia - Uma menina na classe de terceira série de Oscar Ramos tem dificuldade para fazer a lição de casa porque seis parentes se mudaram para o trailer enferrujado de sua família. Um menino diz: "Professor, no sábado, a polícia levou meu irmão".
Na escola elementar Sherwood, Ramos, 37, enxerga a vida por baixo da poeira dos campos. Seus alunos são filhos de trabalhadores agrícolas temporários que labutam nas plantações do vale de Salinas.
Um terço das crianças são migrantes cujos pais acompanham a alface de novembro a abril, de Salinas até Yuma, no Arizona. Algumas não voltam. "Querido senhor Ramos", escrevem. "Espero que se lembre de mim...". Ramos, que também é filho de imigrantes, sempre se lembra.
Escolas como a de Sherwood enfrentam a mobilidade das famílias, a violência nos bairros e uma mentalidade de baixas expectativas acadêmicas. Mas as vidas problemáticas dos filhos de imigrantes provavelmente se tornarão ainda mais complicadas conforme se intensifica o debate nacional sobre imigração.
Apesar de uma decisão da Suprema Corte dos EUA de que toda criança tem direito à educação pública, os esforços de legisladores para revogar a cidadania de crianças nascidas nos EUA de pais imigrantes ilegais e barrá-las das escolas já provocam temores entre trabalhadores agrícolas. Alguns pais, enquanto se deslocam com as safras, mantêm seus filhos fora da escola quando chegam ao Arizona, pois temem a burocracia e as restrições mais rígidas nesse Estado.
Em Sherwood, 97% dos alunos estão perto da linha de pobreza, comparados com 56% em todo o Estado; 77% têm um inglês limitado, contra 32% em toda a Califórnia. Somente 6% dos pais frequentaram o colégio -a média do Estado é de 55%- e muitos são analfabetos na língua nativa.
Sherwood está perto do último lugar no índice de desempenho do Estado, junto com mais de cem escolas elementares da Califórnia com uma frequência semelhante, muitas delas nos enclaves agrícolas dos vales de San Joaquin e Salinas.
Enquanto aumentam as matrículas de latinos, o número de novos professores com credenciais bilíngues diminuiu. A escassez de professores bilíngues está prejudicando as realizações acadêmicas dos latinos, disse Bruce Fuller, um professor de políticas de educação na Universidade da Califórnia em Berkeley.
Professores como Ramos, "que têm ao mesmo tempo a capacidade linguística e a estrutura para reagir às bases culturais desses jovens", são raros, disse o professor Fuller.
Sherwood se situa em um território de disputas violentas entre duas gangues rivais; um aluno da primeira série foi ferido a tiro no ano passado. Bruce Becker, especialista em prevenção da violência em Sherwood, aconselha os alunos que dormem em abrigos para carros e vivem em cômodos tão lotados que seus pais os levem, antes da escola, para a rodoviária local para que tomem banho. Jose Gil, professor de segundo grau, disse que seus alunos quase não veem os pais na temporada de colheita.
"Eles têm irmãos pequenos para cuidar", disse. "Mas e quando precisam entregar um trabalho de dez páginas amanhã?"
O Programa de Educação de Migrantes, iniciativa federal de US$ 394 milhões, oferece atendimento de saúde, escola durante o verão e tutoramento para filhos de imigrantes. Mas quase a metade deles não completa o segundo grau. A Califórnia tem cerca de 200 mil crianças nesse programa, um terço do total nacional.
Há sinais de progresso no programa de educação social Room 21: no ano passado, 13 alunos avançaram um nível em matemática, superando a média estadual apresentada.
A população de estudantes migrantes em Sherwood caiu 10% no ano passado, em parte porque "os pais estão recebendo a mensagem de que não é bom para seus filhos ficarem mudando", disse Rosa Coronado, diretora de educação migrante do condado de Monterrey.
Mas um menino na classe de Ramos não frequentou a escola durante cinco meses. Neste ano, seu pai vai se mudar em busca de trabalho, mas sua mãe ficará em Salinas, temendo que o filho "esteja ficando atrasado", de acordo com suas próprias palavras.


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