São Paulo, segunda-feira, 04 de abril de 2011

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Fado renovado resulta em enorme sucesso

No início era Amália Rodrigues. A cantora domina de tal maneira a história moderna do fado, a dolente música nacional portuguesa, baseada em violões, que, em uma carreira que durou 60 anos e terminou apenas com sua morte, em 1999, o nome dela virou virtualmente sinônimo do gênero, deixando pouco espaço para outros cantores ganharem reconhecimento.
Nos últimos dez anos, porém, muitas novas vozes vêm surgindo, em sua maioria femininas. O chamado novo fado impeliu o gênero para o século 21.
Fora de Portugal, a fadista mais evidente nos últimos tempos é Ana Moura, 31, cujo contralto rouco atraiu a atenção dos Rolling Stones e Prince. Em seu país, ela não passa de uma em grande safra que inclui Mísia, Mariza, Mafalda Arnauth, Dulce Pontes, Cristina Branco, Joana Amendoeira, Raquel Tavares, Yolanda Soares e Kátia Guerreiro.
"Todas nós temos uma coisa em comum: o desejo de renovar o fado", disse Moura, que fará uma turnê na Califórnia e no Canadá no verão americano deste ano.
O fado, cujo nome significa destino, data dos anos 1820 e, segundo Mariza, começou "como a música de um porto, um lugar onde acontecem misturas, com marinheiros trazendo influências do Brasil, da África, do mundo árabe e até mesmo da China" para os bares, tavernas e bordéis que eles frequentavam. Desde o início, a essência do gênero era contida na palavra "saudade".
Tradicionalmente tocado por grupos pequenos que incluem um violão comum e a guitarra portuguesa, instrumento de forma redonda e 12 cordas que possui um som iluminado e delicado, o fado acabou sendo associado à ditadura fascista que governou Portugal entre 1926 e 1974.
"O fado foi um símbolo daquele tempo infeliz", disse Mísia, que, aos 55 anos, pode gabar-se de ser pioneira do "revival" do fado.
O fim do isolamento cultural de Portugal, simbolizado pelo ingresso do país na União Europeia, em 1986, tornou possível que cantores tivessem contato com o que Arnauth, 36, descreve como "fadistas acidentais" -ou seja, músicos estrangeiros que possuem o espírito do fado.
Influências não tradicionais penetram no trabalho das cantoras do "novo fado". O repertório de Ana Moura inclui "No Expectations", dos Rolling Stones, que ela foi convidada a cantar com a banda inglesa depois de esta tê-la visto cantando em uma taverna tradicional de Lisboa. Mísia incluiu em seu CD duplo de 2009, "Ruas", a canção "Hurt", do Nine Inch Nails.
Outra característica da nova safra de fadistas é sua disposição de compor suas próprias canções. E muitas cantoras estão modificando a base instrumental típica do gênero. Até mesmo o austero vestido e xale negros das cantoras de fado tradicionais estão sendo desafiados.
"Eu me recuso a vestir preto ou usar um xale", disse Arnauth. "Esse tipo de roupa transmite uma imagem de vítima, de coitadinha, e isso é algo do qual procuro me afastar. Quero impor uma imagem nova e diferente das mulheres."
O fado também vem ganhando certa presença recente no mundo de língua não portuguesa, influenciando grupos como o Clannad, na Irlanda, e Durutti Column, no Reino Unido. Prince apresentou-se sobre o palco com Ana Moura no ano passado e já gravou com ela. Nos Estados Unidos, a banda Judith & Holofernes tem um estilo que foi apelidado de fadocore, misturando o fado (cantado em inglês) com elementos do punk e indie-rock.
"O fado está evoluindo", comentou Joana Amendoeira. "Como muita gente, tenho um pé no passado e outro no futuro, porque acho que esse é o melhor lugar para estar."


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