São Paulo, segunda-feira, 06 de setembro de 2010

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Além das pirâmides, duas cidades surgem

Por THANASSIS CAMBANIS
CIDADE 6 DE OUTUBRO, Egito - A rodovia que deixa o Cairo para oeste costumava ser promessa de um alívio do caos urbano. Passadas as grandes pirâmides de Giza, faltavam 160 km de deserto até chegar ao mar Mediterrâneo.
Agora, os motoristas que saem do Cairo atravessam 30 km de nada até encontrar uma nova cidade brotando da areia, projetada para aliviar a pressão sobre o centro histórico da capital egípcia.
O Cairo se tornou tão congestionado que o governo egípcio iniciou um projeto que faria os faraós pararem para pensar: construir do nada duas megacidades. Até 2020, os urbanistas esperam que elas abriguem pelo menos um quarto dos 20 milhões de habitantes da metrópole.
Cerca de 1 milhão de pessoas já se mudaram para a Cidade 6 de Outubro, logo a oeste do Cairo, assim chamada em alusão à data da guerra de 1973 entre Egito e Israel, ainda hoje celebrada como uma seminal vitória árabe. Um número semelhante se transferiu para o lugar batizado de Novo Cairo, a leste.
Os planos originais do governo previam que as novas cidades recebessem principalmente aos cairotas da classe trabalhadora. Até agora, porém, a maioria dos moradores é oriunda dos estratos econômicos mais elevados do Egito.
"Esses assentamentos representam a cobiça dos ricos", disse o arquiteto Abdelhalim Ibrahim Abdelhalim, que projetou o novo campus leste da Universidade Americana do Cairo, mas não trabalha mais nos projetos habitacionais de elite.
O governo egípcio já gastou milhões de dólares na construção de estradas e redes de água e luz em áreas desérticas destinadas a um futuro desenvolvimento. Vendeu enormes terrenos a empreendedores em negócios escusos, e construiu algumas moradias de baixa renda. Mas tem dependido primariamente dos empreendedores privados para erguer as mansões e condomínios mais caros dessas cidades, e também seus shoppings e escritórios.
Os cairotas ricos que adquiriram mansões junto a campos de golfe e em condomínios fechados têm a companhia de alguns pobres atraídos pelos empregos industriais e na construção, ou para servir aos ricos. Outros pobres são trazidos à revelia pelo governo, para filas de casas em zonas isoladas, e se queixam de que pegar o ônibus até o centro custa quase o valor de um dia de trabalho.
O desenvolvimento fragmentado tem criado alguns problemas imediatos. O novo empreendimento carece de metrô, empregos suficientes, escolas e serviços médicos. As empresas, no entanto, estão se mudando para esta nova cidade, e o governo pretende instalar vários ministérios e serviços lá.
Alguns quilômetros adiante, deserto adentro, os empreendedores estão construindo uma réplica do centro de Beirute, que servirá como um núcleo urbano para todos os condomínios fechados e outros empreendimentos que proliferam no deserto.
Egípcios abastados que se instalaram nas cidades do deserto se entusiasmam com seu novo estilo de vida.
"O Cairo é quente e lotado", disse Noha Refaat Elfiky, 33, que se mudou há um ano para Palm Park, vinda de Heliópolis -bairro, aliás, construído para ser um refúgio arborizado em relação ao centro do Cairo, no século 19, mas agora engolido pela cidade. "Não há nada a perder e muito a ganhar se todo mundo se mudar para fora da cidade."
Mesmo assim, Elfiky ainda passa uma ou duas noites por semana no apartamento da sua família no Cairo. "Às vezes", afirmou ela, "sinto falta do cheiro da poluição".


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