São Paulo, segunda-feira, 06 de setembro de 2010

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ARTE & ESTILO

Monitorando sítios antigos com técnicas modernas

Por RANDY KENNEDY
O campo da arqueologia e o Oriente Médio, gasto pelo tempo, podem não parecer lugares óbvios para se procurar por uma revolução wiki. Mas autoridades da Jordânia responsáveis pelo rol imenso de antiguidades desse país vão iniciar em breve um experimento que visa usar ferramentas do século 21 na proteção de sítios antigos. A necessidade é especialmente urgente no vizinho Iraque, onde saques de artefatos antigos voltaram a aumentar.
Nos últimos quatro anos, o Instituto Getty de Conservação, de Los Angeles, com financiamento do Fundo Mundial de Monumentos e ajuda do Departamento de Antiguidades jordaniano, montou sistema ambicioso baseado na internet que, pela primeira vez, vai permitir que arqueólogos e conservadores tenham acesso a décadas de registros sobre os sítios da Jordânia e monitorem sua condição com muito mais facilidade.
Conhecido pelo nome Mega - sigla formada pelas iniciais, em inglês, de Geobanco de Dados de Antiguidades do Oriente Médio-, o sistema funciona com informações obtidas por meio de imagens via satélite fornecidas pelo Google Earth. Os usuários poderão localizar qualquer um dos mais de 10 mil sítios da Jordânia, desde a cidade antiga de Petra até minúsculos resquícios da antiguidade escavados, como lagares (usados na produção de vinho), eiras e locais de sepultamento que datam do período neolítico.
Até agora, os relatórios de campo sobre esses sítios eram catalogados em um banco de dados local na Jordânia, mas o novo sistema permite que essas informações sejam localizadas e atualizadas muito mais fácil e rapidamente. O sistema não impedirá a ação dos ladrões de túmulos, mas permitirá que a Jordânia identifique os danos, roubos e outras modificações e reaja fazendo uso mais eficiente de seus recursos. "A regra clássica na conservação é que não é possível conservar alguma coisa enquanto você não sabe que a possui", disse Timothy P. Whalen, diretor do Instituto Getty de Conservação, uma divisão do Fundo J. Paul Getty. "Esse tipo de ferramenta não existe em lugar algum no momento."
O sistema deve entrar em funcionamento este mês, mas será aberto apenas a usuários autorizados.
Muitos arqueólogos dizem esperar que, com o tempo, ele fique disponível para um grupo muito maior de estudiosos e conservadores, para que possam acessar o banco de dados e fazer acréscimos a ele.
Ziad al Saad, diretor geral do Departamento de Antiguidades da Jordânia, disse que o país -onde a segurança e o acesso a informações oficiais são tópicos delicados- estuda a hipótese de fazer o sistema ser livremente acessível.
"O turismo é setor crucial da economia, e nossos sítios arqueológicos são cruciais para o turismo", disse.
A ideia original era que o sistema, cujo custo é de cerca de US$ 1 milhão, começasse a ser usado no Iraque, onde os saques após a invasão de 2003 desencadearam alertas internacionais sobre as ameaças a alguns dos artefatos mais antigos do mundo. Mas o caos e a violência acabaram impedindo o Getty de colaborar com as autoridades nesse país.
"A ideia de enviar alguns computadores grandes ao Iraque e esperar que eles chegassem e que tudo funcionasse parecia improvável demais", explicou Alison Dalgity, gerente sênior de projeto no Getty que ajudou a desenvolver o Mega.
Por essa razão, o instituto aceitou um convite da Jordânia.
A necessidade de um sistema de monitoramento desse tipo no Iraque é premente. Após vários anos de calma relativa, os saques a sítios arqueológicos voltaram a aumentar, em grande parte devido à retirada das tropas americanas e das insuficiências de uma nova polícia de antiguidades iraquiana.
Mesmo a Jordânia, que tem sido eficaz na proteção e preservação de seus sítios, enfrenta ladrões, projetos de construção que escavam e destroem mosaicos e gado que se desloca livremente nas proximidades dos sítios, prejudicando-os. Dalgity contou que em julho visitou os resquícios de um palácio de 1.300 anos nas proximidades de Amã cujos afrescos estavam pichados.
De acordo com Whalen, apesar de a situação no Iraque ter se estabilizado muito, os problemas de segurança e as mudanças nas autoridades burocráticas ainda são obstáculos que dificultam a hipótese de o sistema ser levado para esse país.
"Ainda é cedo, até mesmo para especular sobre isso", disse. "Vamos ter que aguardar para ver que tipo de estabilidade se desenvolve."
Mas o responsável pelos sítios arqueológicos do Iraque disse que o país está preparado para avançar. "Acho que a situação de segurança faz o outro lado pensar duas vezes antes de entrar em ação", disse em mensagem de e-mail o diretor do Conselho Estatal de Antiguidades e Patrimônio do Iraque, Qais Hussein Rashid.
Whalen disse que, se o programa se mostrar eficaz no Oriente Médio, pode facilmente ser adaptado para uso em qualquer lugar. "Bastaria desligar o botão árabe, e o sistema poderia ser usado até mesmo pelos canadenses, se quisessem."


Colaborou Duraid Adnan, de Bagdá



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