São Paulo, segunda-feira, 07 de fevereiro de 2011

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Na Europa, artes precisam cortejar o comércio

Museus passam por dificuldades financeiras

Por DOREEN CARVAJAL

PARIS - Na margem esquerda do Sena, a fachada do prédio art-nouveau com teto de vidro que abriga o Musée d'Orsay está envolvida por um enorme anúncio do perfume Chanel.
O Palácio de Versalhes planeja dois hotéis em seus amplos terrenos. Um deles transformará um prédio-tesouro do século 17 que está desmoronando em uma reserva de luxo de suítes pintadas nas cores favoritas de Maria Antonieta, rosa e azul pastel, por US$ 950 a noite.
E, no Museu Ara Pacis, em Roma, em dezembro, havia carros elétricos Dany estacionados dos dois lados do "altar da paz" de mármore construído pelo imperador romano Augusto, depois que um empresário italiano pagou US$ 110 mil em patrocínio.
Os museus europeus, hoje, sofrem com o choque cultural. Há muito tempo dependentes de subsídios governamentais, eles evitaram as demissões, cortes de salários e aumentos de ingressos que afetaram duramente os museus americanos em 2009, quando as doações despencaram com a crise financeira. As instituições de arte europeias também enfrentam o arrocho: os subsídios do governo estão caindo, e as doações corporativas diminuem com a crise econômica. Essa combinação está fazendo com que até os maiores museus sejam obrigados a buscar novas fontes de renda.
Algumas estratégias são muito "sem classe" para esses baluartes da alta cultura, para consternação de alguns no mundo da arte. Na Holanda, o governo vai reduzir os gastos com artes em 20% -US$ 269 milhões- nos próximos quatro anos.
O Ministério da Cultura disse que o número de visitantes será fator decisivo para quais instituições receberão dinheiro. Em Madri, o Museu de Arte Nacional Rainha Sofia vai ter desconto em eletricidade em troca de publicidade das fornecedoras.
Os grandes museus aumentando o preço dos ingressos e reduzindo o número de funcionários, o que leva os sindicatos a advertir que os horários de visita talvez precisem ser reduzidos.
O Louvre, o museu mais concorrido do mundo, com mais de 8,5 milhões de visitantes por ano, aumentou o preço dos ingressos de cerca de US$ 12,80 para US$ 13,50 neste ano e está avaliando propostas, entre elas a de licenciar seu nome para o fabricante de relógios de luxo Breguet.
O subsídio estatal do Louvre encolheu de 75% de seu orçamento em 2001 para pouco mais da metade do orçamento de US$ 340 milhões no ano passado. Um corte de 5% paira sobre quase todas as 500 instituições culturais francesas.
A manutenção de velhos edifícios é um ralo para instituições europeias como o Castelo de Versalhes, que está desenvolvendo hotéis e procura licenciar seu nome para relógios de luxo e outros produtos.
Em dezembro, ele abriu uma butique on-line com ofertas como uma sopeira de porcelana Maria Antonieta em ouro e marfim e velas de coco.
Jean-Jacques Aillagon, presidente do Castelo de Versalhes, disse: "Todo o dinheiro é investido em renovação, restauração, aquisições e organização de exposições. O resultado de nossa busca por novos recursos não é ganhar mais dinheiro só pelo dinheiro. É investir em nossa herança, que é uma responsabilidade enorme e custosa".
Os museus também estão levantando dinheiro com o envio de obras-primas em turnês globais. Instituições de classe internacional como o Louvre e o Museu Metropolitano de Arte de Nova York costumavam trocar pinturas sem custo, mas hoje cobram taxas e avaliam de maneira mais agressiva as alianças com museus estrangeiros. Algumas instituições francesas enviaram exposições itinerantes, basicamente alugando mostras inteiras para museus regionais nos Estados Unidos e na Ásia -correndo o risco, segundo alguns curadores, de desgaste e avarias em obras-primas.
Jean-Michel Tobelem, diretor da instituição de pesquisa francesa Option Culture, disse que o circuito itinerante de belas-artes apresenta questões difíceis sobre o compartilhamento de obras-primas somente com museus ricos.
E assim prolifera a publicidade ao ar livre. É uma maneira de preencher a lacuna, por mais feio que possa parecer em um cartão-postal. Em Paris, além do anúncio de Chanel, cartazes gigantescos de perfume Yves Saint-Laurent, Ralph Lauren, Air France e roupas H apareceram nos últimos meses nas fachadas do Musée d'Orsay e na ópera Palais Garnier.
Mas os museus insistem que há limites. "Recusamos uma garrafa de Coca-Cola", diz Amélie Hardivillier, uma porta-voz do Musée d'Orsay, que não quis revelar as taxas pagas pelos anunciantes. "O frasco de Chanel é bonito porque é feito em três dimensões e se move com o vento."


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