São Paulo, segunda-feira, 10 de outubro de 2011

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Milhares voltam da Líbia ao Níger sem emprego

Seca uma fonte de renda para um país africano pobre

Por ADAM NOSSITER

NIAMEY, Níger - Para dezenas de milhares de cidadãos do Níger, a queda do coronel Muammar Gaddafi foi uma catástrofe econômica, mergulhando-os repentinamente de um mundo de bons salários na Líbia de volta para o universo precário de seu país natal, um dos mais pobres e dependentes da Terra.
Mais de 200 mil nigerinos fugiram das lutas desde março, segundo o governo local, atravessando o deserto desde a Líbia, onde ganhavam pagamentos altos, pelos padrões locais, como alfaiates, guardas de segurança, motoristas e cozinheiros.
A maioria dos fugitivos hoje está sem dinheiro, faminta e, juntamente com as milhares de famílias dependentes de remessas da Líbia, sem perspectivas.
As autoridades do Níger estimam que pelo menos 200 pessoas continuem chegando diariamente, e que mais atravessam as fronteiras porosas do deserto. O governo admite que não tem recursos para ajudá-las e pediu ajuda a doadores estrangeiros.
Em junho a migração forçada havia feito um buraco de US$ 80 milhões na economia do Níger, segundo o governo. Esse número cresceu desde então e é desastroso em um país onde o Banco Mundial diz que mais de 60% das pessoas vivem em extrema pobreza, onde a fome espreita quando as chuvas não chegam e onde a metade do orçamento nacional vemde doadores.
De repente, os migrantes que haviam fornecido mão-de-obra para a Líbia se encontram em um campo onde mendigos sem membros se reúnem nos cruzamentos e o que há de comida é vendida em barracas improvisadas.
Pela chance de ganhar salários dez vezes maiores que no Níger, valia a pena suportar a perseguição e o preconceito em um país dominado por árabes, onde os africanos eram tratados como cidadãos de segunda classe.
"Aquela vida lá é algo que você não pode ter aqui no Níger", disse Abubakar Hassan, que trabalhou como cozinheiro para empresas multinacionais em Trípoli antes de fugir e está sem trabalho há mais de cinco meses.
Dois morreram no caminhão lotado de sacos e passageiros que transportou Hassan e outros para fora da Líbia. "Trinta dias de sofrimento", afirmou.
Adamou Hamani, um ex-oficial de segurança ambiental de 29 anos que costumava inspecionar obras na Líbia, ganhando cerca de US$ 600 por mês, disse que deixou seu currículo em seis companhias diferentes no Níger, sem sucesso. "Elas nem sequer entendem o que eu faço", disse. "Estou empacado. Não tenho planos."
Na região rural miserável o corte repentino de remessas da Líbia foi ainda mais doloroso. Grande parte da população sobrevive da agricultura de subsistência. No período entre as colheitas, que os nigerinos chamam de "brecha", o dinheiro é crítico.
Um associado à Organização Internacional para Migração que circula pelas aldeias falou sobre o desespero das pessoas.
"Assim que você chega em um carro, as pessoas se reúnem ao redor porque pensam que você está trazendo ajuda", disse Boubacar Seybou. "A transferência de dinheiro dos migrantes é o único recurso financeiro de muitas dessas famílias."
Abdelkader Agaly, vice-chefe de gabinete do primeiro-ministro, que está dirigindo os esforços de ajuda, disse: "Precisamos de US$ 60 milhões. Os US$ 2 milhões que distribuímos não representam absolutamente nada".
Agaly fez uma advertência para o Ocidente: os milhares de jovens sem esperança que hoje voltam a seu país podem representar um alvo de recrutamento tentador em uma região onde atuam o que ele chamou de "forças do mal" -a afiliada norte-africana da Al Qaeda já fez incursões aqui.
"Não é fácil", disse Ali Jibo, um alfaiate que fugiu da Líbia. "Eu parti para ter uma vida melhor. A Líbia é um país rico. Isto aqui é muito pobre. Aqui as pessoas estão sofrendo."

Contribuiu Issa Ousseini com reportagem


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