São Paulo, segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

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Com risco, China investe no Afeganistão

Por MICHAEL WINES

CABUL, Afeganistão - Atrás de uma cerca eletrificada, de sacos de areia resistentes a explosões e de 53 postos da Polícia Nacional, o aumento de tropas no Afeganistão já começou.
Mas os soldados rasos presentes em um vale a 30 km de Cabul não estão combatendo o Taleban e nem sequer portam armas. Eles se preparam para extrair cobre de uma das maiores reservas virgens da terra. E são chineses. Estão empreendendo o maior projeto de investimento estrangeiro no Afeganistão, país dilacerado pela guerra.
Dois anos atrás, a China Metallurgical Group, um conglomerado estatal chinês, ofereceu US$ 3,4 bilhões -US$ 1 bilhão a mais que qualquer de seus concorrentes de Canadá, Europa, Rússia, EUA e Cazaquistão- pelo direito de explorar os depósitos de cobre próximos ao povoado de Aynak.
Nos próximos 20 anos, a empresa pretende extrair quase 10 milhões de toneladas de cobre -equivalente a um terço de todas as reservas conhecidas de cobre na China. Enquanto os EUA gastam centenas de bilhões de dólares combatendo o Taleban e a Al Qaeda no Afeganistão, seu concorrente em ascensão mais acelerada está garantindo matéria-prima para alimentar sua economia voraz.
S. Frederick Starr, presidente do Instituto Ásia Central-Cáucaso, organização independente de pesquisas sediada em Washington, disse que os céticos podem perguntar-se se Washington e a Otan não terão realizado "uma fase preparatória não reconhecida para a penetração econômica chinesa do Afeganistão".
A China rejeitou o pedido para que entrasse no esforço de guerra no Afeganistão, dizendo que sua política proíbe ações militares exceto no contexto de uma força de manutenção da paz. "Nós fazemos o levantamento pesado, e eles colhem os frutos", observou Starr.
A realidade é mais complexa que isso. Os chineses fizeram uma oferta muito maior que os outros países pelos direitos de exploração do projeto Aynak e prometeram investir outras centenas de milhões de dólares em projetos infraestruturais associados. É um empreendimento de alto risco que ainda não comprovou ser economicamente válido e que já é alvo de denúncias de corrupção.
Mas o investimento em Aynak destaca a maneira como os líderes chineses, com dinheiro nas mãos e exercendo o controle tanto do governo quanto das principais indústrias, fundem estratégia, negócios e direção política.
O Afeganistão não é o único lugar onde EUA e China se veem justapostos de maneira incomum. A China está investindo mais que empresas americanas na extração de petróleo iraquiano. Ela fechou acordos de longo prazo para comprar gás do Irã.
Também se tornou investidora dominante no Paquistão e em partes voláteis da África. Mas é no Afeganistão que mais se destaca a disposição da China em assumir riscos em nome de lucros comerciais e diplomáticos.
A China Metallurgical Group (MCC) vai construir uma usina geradora de 400 megawatts para fornecer energia tanto para a mina de cobre quanto para Cabul, onde blecautes são frequentes. Vai construir uma fundição para refinar o minério de cobre e uma ferrovia para levar carvão à usina elétrica e cobre de volta à China. Pelos termos de seu contrato, a MCC também deverá construir escolas, estradas e até mesquitas para os afegãos, além de povoar o empreendimento inteiro com trabalhadores afegãos.
Mas, mesmo se alguns elementos do acordo não se concretizarem, os chineses já terão se posicionado como parceiros generosos e interessados do governo afegão e atores de longo prazo no futuro do país. E tudo isso sem disparar um único tiro.
A Polícia Nacional afegã, que protege a mina, foi em grande medida formada e treinada com dinheiro americano. Mas, segundo o general Sayed Kamal, comandante policial, os 1.500 guardas posicionados em Aynak e arredores são recrutas especiais que não saíram da força policial principal.
Tropas americanas ajudaram a tornar o Afeganistão seguro para receber investimentos chineses. E não existe a impressão de que nenhum dos governos faça objeções a essa realidade. "Na medida em que os chineses possam modernizar o Afeganistão e começar a pagar US$1 bilhão por ano em royalties", disse um funcionário governamental ocidental, "isso significará que o Afeganistão estará em condições melhores para começar a pagar por sua própria segurança".

Colaborou Li Bibo, em Pequim



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