São Paulo, segunda-feira, 12 de abril de 2010

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Países culpam a China, e não a natureza, pela seca

Por THOMAS FULLER

BANCOC - No sul da China, a pior seca em pelo menos 50 anos devastou os campos agrícolas e deixou dezenas de milhões de pessoas sem água.
Mas a seca também criou um grande problema de relações públicas para o governo chinês e os países vizinhos, onde nos últimos anos a China tentou projetar uma imagem de benevolência e fraternidade.
Agricultores e pescadores de países que compartilham o rio Mekong com a China, especialmente a Tailândia, criticaram Pequim por causa de quatro barragens na parte chinesa do rio, apesar do que parecem ser sólidas evidências científicas de que o baixo volume das chuvas é responsável pela redução dos níveis do rio.
Recentemente, um grupo de países afetados -Mianmar, Laos, Camboja e Vietnã- se reuniu na Tailândia para discutir a seca, entre outras questões. A China começou uma campanha para tentar mudar a visão de que suas represas estão sequestrando a água do Mekong, que corre do planalto tibetano ao mar do Sul da China.
As autoridades chinesas, normalmente tímidas com a mídia, recentemente deram uma entrevista coletiva e participaram de seminários para defender sua tese de que a seca é meramente um fenômeno natural.
"Mais informação vai ajudar a reduzir a desinformação", disse Yao Wen, diretor da seção política da embaixada chinesa em Bancoc.
Ele apresentou fotos de leitos de rios queimados pelo sol e poços secos, incluindo uma de um homem saltando as rachaduras em um leito de rio seco. "Este velho costumava ser um barqueiro, mas hoje não tem nada para fazer", disse Yao no seminário.
A imagem final era de uma criança olhando com tristeza para dentro de um balde. "Você pode ver como a seca é grave", ele disse. "É uma situação terrível."
Ainda assim, muitos continuaram criticando as represas da China. Yao escutou súplicas apaixonadas de moradores do norte da Tailândia para deter novas construções sobre o rio. "É onde nós pescamos, onde conseguimos alimento", disse Pianporn Deetes, ativista tailandesa do grupo ambientalista International Rivers. "É onde alimentamos nossas famílias."
Ela culpou as barragens chinesas e a explosão de corredeiras para tornar o rio mais navegável pela redução do volume de peixes e criticou os planos de mais represas sem consultas públicas transparentes.
Segundo contagem recente, há mais de 80 projetos de hidrelétricas em várias etapas de preparação e construção para o Mekong e seus afluentes. "Como vocês podem decidir sem nos escutar?", perguntou Pianporn, nativa da Província de Chiang Rai, no norte da Tailândia.
Como em muitas partes do mundo, a política de divisão de águas é cheia de tensão. Na Tailândia, onde a seca afetou pelo menos 14 mil aldeias, uma autoridade descreveu "guerras da água" entre agricultores que esperam manter suas plantações vivas.
Mas as discussões entre os países que compartilham o Mekong são mais complexas. Uma abordagem comum no planejamento do futuro do rio significa acomodar a sociedade animada e livre da Tailândia, a ditadura militar de Mianmar, a democracia autoritária do Camboja e os sistemas comunistas do Laos e do Vietnã.
Muitos tailandeses continuam particularmente desconfiados dos planos chineses para o Mekong, chamado Lancang em chinês.
Um professor no recente seminário prefaciou uma pergunta a Yao, o diplomata chinês, com isto: "Percebo que é difícil para o senhor falar livremente -depois dessa conferência, o senhor seria demitido se falasse livremente".


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