São Paulo, segunda-feira, 13 de setembro de 2010

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NOVA YORK

Esqueça os vampiros; estes mordem de verdade

Por EMILY B. HAGER
Jeremy Sparig passou meses combatendo os percevejos. Hoje, para algumas pessoas, é melhor evitá-lo. "Elas não querem mais abraçá-lo, não querem que você as visite", disse Sparig, de East Williamsburg, no Brooklyn, um bairro de Nova York. "Você é como um leproso."
Além das picadas e da coceira, do incômodo e da despesa, as vítimas da mais recente praga de Nova York estão descobrindo que uma aflição invisível os aguarda na forma do estigma do percevejo. Os amigos começam a manter distância. Convites são cancelados. Uma mulher contou que, durante meses, sua mãe teve medo de lhe dizer que estava infestada.
O medo e a desconfiança espreitam onde quer que os percevejos apareçam, isto é, em quase todo lugar: "Os órgãos de saúde pública de todo o país foram inundados de reclamações sobre percevejos", afirmaram, em uma declaração conjunta em agosto, os Centros para Controle e Prevenção de Doenças e a Agência de Proteção Ambiental.
Os insetos, que não são conhecidos como transmissores de doenças, podem se propagar nas roupas, saltar de dentro de livros e espreitar dos móveis. E, é claro, eles mordem.
Mesmo em Nova York, onde a barata e o rato são considerados membros do cadinho cultural, ninguém quer ser associado às minúsculas pestes que tratam os corpos adormecidos como banquetes.
Estilos de vida inteiros estão ameaçados. Tutores e professores de música que vão de um apartamento a outro temem perder seus clientes. Uma dona de bufê cancelou o trabalho e vestiu-se de mangas compridas e calças durante os dias mais quentes de julho para que ninguém visse suas picadas. "Quem vai me querer em sua casa?", disse.
Nas últimas semanas, os percevejos se instalaram nas poltronas de um cinema na Times Square, se esgueiraram por uma loja da Victoria's Secret na Avenida Lexington e nos escritórios da revista "Elle" e chegaram até o gabinete do subsecretário da Justiça do Brooklyn.
"Alguns advogados não quiseram entrar em nosso prédio", disse um vice-secretário. "Não os culpo; eu não gostaria de ir a um lugar onde se sabe que há percevejos."
Antes quase erradicados, os percevejos se espalharam pela cidade de Nova York em parte por causa do declínio do uso de pesticida DDT. Segundo o Departamento de Habitação e Preservação da cidade, o número de reclamações de percevejos aumentou 67% em dois anos. No último ano fiscal, que terminou em 30 de junho, a linha telefônica de ajuda da cidade registrou 12.768 queixas de percevejos, 16% a mais que no ano anterior e 39% a mais que no precedente. Uma pesquisa de saúde comunitária da cidade de Nova York mostrou que, em 2009, 1 em cada 15 nova-iorquinos tinha percevejos em casa, número que hoje é provavelmente maior.
Evidências esparsas sugerem que o custo social dos percevejos também está aumentando.
A melhor amiga da dona do bufê ficou assustada e não a convidou para sua casa de verão nestas férias.
Quando Hilary Davis, uma garçonete do Brooklyn, teve seu apartamento tratado dois anos atrás por causa de percevejos, suas amigas e até seu namorado se recusaram a hospedá-la.
"Então fiquei sozinha em um apartamento infestado de insetos", ela disse.
O comportamento cotidiano também está mudando. "Não vou mais ao cinema, não me sento naquelas poltronas, nem mesmo em bancos de madeira", disse Gale A. Brewer, membro da Câmara de Vereadores.
Mas o pânico não é generalizado. "Tudo faz parte da vida", disse Janice Page, do Bronx, outro bairro de Nova York, que recentemente pensou ter recebido duas picadas enquanto viajava pela Califórnia (afinal eram picadas de mosquitos). "O que vou fazer? Carregar uma lata de inseticida?"
"É como o terrorismo", disse uma mulher ao entrar em um cinema recém-dedetizado. "Cruze os dedos e vá em frente."
Um projeto de lei que exige que os proprietários revelem aos potenciais inquilinos se algum apartamento do prédio teve percevejos no ano anterior foi aprovado pela Câmara, apesar da oposição dos proprietários.
Talvez ninguém esteja mais sintonizado com a paranoia do percevejo do que Steven Brodsky, psicoterapeuta de Manhattan. Ele trata pessoas que sofrem de distúrbio obsessivo-compulsivo e recebeu várias vítimas de percevejos.
Os pacientes dizem que sentem que estão "se sacrificando, porque literalmente são comidos enquanto dormem", disse.
"É realmente como a H1N1", disse o doutor Brodsky, usando o termo clínico para a gripe suína que ameaçou no ano passado. "Todo mundo está preocupado com isso, perguntando se será o próximo."
E Brodsky confessa: quando o último paciente do dia sai, "verifico a cadeira para ver se há alguma coisa".


Colaboraram Emma Graves Fitzsimmons e Mathew R. Warren



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