São Paulo, segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

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Jovens imigrantes vão à escola pela primeira vez

Por JENNIFER MEDINA

Fanta Konneh é a primeira garota de sua família a frequentar a escola. Não a primeira a fazer faculdade ou a primeira a concluir o ensino médio. No ano passado, Fanta, 18, que cresceu na Guiné, depois de sua família ter fugido da Libéria, tornou-se a primeira mulher de sua família a entrar numa sala de aula de qualquer espécie.
"Só os rapazes vão à escola, por isso eu sempre soube que ficaria de fora", disse Fanta, aluna da Academia Preparatória Ellis, em South Bronx, Nova York. "Mas estou tentando aqui. Já sei dizer muitas coisas que eu não sabia antes."
Não é de hoje que as salas de aula de Nova York são repletas de alunos de todo o mundo e dos desafios educacionais que eles trazem. Mas, escondidos entre os quase 150 mil estudantes na cidade que ainda se esforçam para aprender o inglês, há estimados 15,1 mil que, como Fanta, tiveram pouco ou nenhum ensino formal e, com frequência, são analfabetos em suas línguas nativas.
"Eles nem sempre têm uma noção do que significa ser estudante", comentou a professora de inglês Stephanie Grasso, da escola Ellis Prep, aberta no último outono americano como a primeira escola de Nova York dedicada a esta população estudantil difícil de ensinar. "Certas ideias lhes são totalmente estranhas. Eles precisam aprender a fazer perguntas e entender as coisas por eles mesmos."
A maioria desses estudantes vem de áreas rurais da República Dominicana, onde não frequentavam a escola porque ficava longe demais de suas casas ou porque trabalhavam para sustentar suas famílias. Outros jovens vieram fugidos da perseguição religiosa no Tibete, de guerras civis na África ocidental ou da pobreza extrema na América Central, frequentemente tendo perdido anos de aula enquanto viviam em campos de refugiados.
Educadores e especialistas dizem que adolescentes que chegam sem saber ler em qualquer idioma enfrentam pressões tremendas para ganhar a vida independentemente e, ao mesmo tempo, tentar recuperar mais de uma década de ensino perdido.
A escola Ellis Prep foi criada pela assistente social Norma Vega, ex-diretora da Escola Internacional de Ensino Médio do Bronx. "Se esses alunos frequentassem os colégios normais, eles simplesmente ficariam perdidos", disse.
Apesar dos obstáculos que precisam transpor, muitos dos alunos da Ellis nutrem grandes ambições. Adolescentes que mal conseguem ler o inglês falam em tom confiante sobre o futuro que almejam como enfermeiros, arquitetos ou químicos. Mesmo entre aqueles que enfrentam dificuldade com a geometria básica, existe a ambição de fazer faculdade.
"O mais difícil é saber que nem todos vão conseguir", disse Vega. "A ética de trabalho deles é impecável, mas é possível que eles não consigam."
Os estudantes da Ellis frequentemente trabalham em grupos. Os mais novos recorrem aos que estão na escola há mais tempo para explicações e traduções.
Pouco antes de chegar à escola, vindo do Mali, Djibril Sumarei recebia instruções sobre como fazer um cartaz sobre religião para a aula de história. Quem o estava ajudando era Mohammed Alesadi, que imigrou do Iêmen há dois anos e às vezes escreve as palavras de trás para diante.
"Eu escrevo em árabe e você em francês", disse Mohammed a Djibril, falando em inglês. A cada poucos minutos eles falavam baixo em árabe, a língua da escola muçulmana que Djibril frequentou por alguns anos na Mauritânia. O cartaz ficou recoberto de legendas difíceis de decifrar.
Fanta é um exemplo tanto da distância já percorrida por muitos dos estudantes quanto dos obstáculos que eles ainda enfrentam. "Eu não conhecia ninguém na minha sala e na hora do almoço", ela escreveu em inglês rudimentar num memorando feito para explicar como se sentiu perdida ao chegar ao colégio. Mas ela acabou fazendo amizades "e agora sei me comunicar na escola", completou.
Fanta falou com confiança sobre o futuro que quer ter, trabalhando com negócios. "Se eu ganhar dinheiro, talvez possa mandar de volta à África", disse ela. "Poderei ajudar minha mãe. Vim para a escola para isso, também."
Mas, depois de assistir às aulas sem uma única falta no outono americano, desde o Ano Novo Fanta não retornou. Vega diz que ficou sabendo que a aluna está grávida de cinco meses.


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