São Paulo, segunda-feira, 16 de agosto de 2010

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YURI SHEVCHUK

Astro do rock russo não teme confrontar o Kremlin

Por MICHAEL SCHWIRTZ

SÃO PETERSBURGO, Rússia - A reverência pelos líderes russos, sejam eles czares, secretários-gerais ou presidentes, nunca foi fácil para Yuri Shevchuk. Um rock star de óculos e ligeiramente grisalho, Shevchuk passou a maior parte dos últimos 30 anos rosnando em um microfone, na tentativa, segundo ele, de despertar em seus compatriotas a paixão por romper um antigo costume de aceitar a autoridade opressiva.
Hoje, aos 53, Shevchuk continua sendo uma voz gutural de protesto, assim como era quando começou a evitar a censura soviética realizando shows secretos em apartamentos por toda a Rússia, no início da década de 1980.
Mas hoje ele denuncia o governo e o premiê Vladimir Putin em seus shows lotados e zomba abertamente de outros músicos, que acusa de vendidos.
Em junho, ele pôs em prática sua pregação, surpreendendo os russos ao fazer um discurso de improviso contra abusos oficiais durante uma reunião com Putin.
Ele denunciou o abuso de poder, as restrições à livre expressão e os "duques ricos com seus privilégios". "A única maneira de progredir é tornar todos iguais diante da lei", disse.
Putin retrucou, defendendo a polícia, mas também o direito da população de se manifestar contra o governo. O confronto foi transmitido pela televisão controlada pelo governo, e o vídeo, colocado no site de Putin na web.
Em seu estúdio de gravação em São Petersburgo, Shevchuk falou sobre uma divisão de mil anos entre a elite russa e os demais. Putin, o líder supremo da Rússia, e o presidente do país, Dmitri Medvedev, são apenas a última encarnação da autoridade fria e desconectada que sufoca a sociedade russa, disse Shevchuk.
Ele foi atraído para o rock como uma forma de escapar ao pântano da Rússia soviética nos anos 70, a era de estagnação de Brejnev.
"O som rouco da guitarra elétrica libertou nossa geração da escuridão e da escravidão", disse. "Nós queríamos os Beatles, os Rolling Stones, Jethro Tull, Led Zeppelin e Van Morrison, e éramos gratos por todas as canções porque eram novas. Era a energia dos tempos modernos."
Em 1980, ele fundou a DDT, banda que se tornou um dos pilares da cena do rock na era da perestroika em São Petersburgo, embora só tenha apresentado seu primeiro concerto em 1987, quando Mikhail Gorbatchov começou a abrandar as restrições paralisantes do regime soviético.
Com as novas liberdades, os russos sofreram o colapso econômico, a corrupção generalizada e o crime, duas guerras na região separatista da Tchetchênia, no sul, e uma série de ataques terroristas mortais originários desses conflitos. O caos levou à ascensão de Putin.
Shevchuk e outros músicos descrevem uma espécie de censura branda aos artistas que acompanhou a ascensão de Putin ao poder e continuou sob o governo do presidente Medvedev.
Shevchuk diz que sua recusa a se conformar teve um preço. Apesar de ele ter uma grande base de fãs, seus shows raramente são televisionados. Ele acusou as estações de rádio de censurar suas canções -uma recente que inclui o verso "Quando o petróleo terminar nosso presidente morrerá" raramente é tocada.
Seja qual for a popularidade de Shevchuk, Putin é a maior celebridade da Rússia, e nenhuma quantidade de críticas desgastou seu apoio.
Shevchuk admite que sua influência e a de outros músicos diminuiu desde o tempo da perestroika. Seu último projeto, que será o primeiro grande álbum da DDT em cinco anos, vai mostrar parte de sua frustração. E os acontecimentos na Rússia vão ajudar a definir seu nome.
"O título de trabalho é 'Antes da Inundação'", ele disse. "Mas, agora, estou pensando em um novo nome: 'Amanhã Será Diferente'. Ambos são a mesma coisa, mas no segundo nome há mais esperança."


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