São Paulo, segunda-feira, 18 de abril de 2011

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Sigla de Mugabe quer antecipar pleito

Por CELIA W. DUGGER

HARARE, Zimbábue - Enquanto o Zimbábue mergulha em mais uma temporada política violenta, o partido do presidente Robert Mugabe está fazendo pressão forte por uma eleição antecipada neste ano, devido a receios quanto à saúde do presidente, disseram altos funcionários do partido.
Sem sucessor em vista que seja capaz de unir as facções divididas do Zanu-PF, os representantes do partido dizem que precisam que Mugabe -que tem 87 anos e está no poder há 31- faça campanha por mais um mandato de cinco anos enquanto ainda tem a força necessária para concorrer com seu rival, o primeiro-ministro Morgan Tsvangirai, 59.
"A urgência é real", disse um membro bem informado do partido. "O velho não é mais quem era. Imagine-o sendo ajudado a subir ao pódio para discursar em um comício e dizendo ao povo que é o futuro deste país. Mesmo seus partidários não acreditariam."
Os vizinhos do Zimbábue, que depois de uma eleição desacreditada em 2008 ajudaram a mediar a formação de um governo de partilha do poder liderado por Mugabe e Tsvangirai, desaconselharam fortemente qualquer tentativa de promover outra eleição em pouco tempo. Durante muito tempo, a África do Sul foi criticada por ter apoiado Mugabe ao longo de uma década de eleições fraudulentas e manchadas de sangue, mas o presidente sul-africano, Jacob Zuma, persuadiu líderes regionais a endossar os esforços para assegurar que, na próxima vez em que os zimbabuanos forem votar, possam fazê-lo de modo livre e justo.
Mugabe, em tom de desafio, convocou seus seguidores a se prepararem para uma eleição. Um editorial publicado no jornal controlado pelo Estado "The Sunday Mail" acusou Zuma de dissimulação e desonestidade.
Autoridades sul-africanas reagiram com aspereza ao ataque pessoal contra o presidente do país mais poderoso da região, e o porta-voz de Mugabe procurou abrandar o tom do discurso zimbabuano, dizendo que o editorial não refletia posição do governo.
O governo de Mugabe levou o país ao declínio econômico desastroso, à corrupção onipresente e a uma sociedade repressora.
Sobre seu inimigo político e parceiro dominante na partilha do poder, Tsvangirai afirmou: "Ele deixou a sucessão para tarde demais e agora está acontecendo disputa entre as duas facções principais do Zanu-PF".
Um embaixador ocidental no Zimbábue comparou o período atual em uma das autocracias africanas de mais longa duração aos últimos dias de Brezhnev e Franco -um período de rumores febris e conspirações escusas.
E esse período trouxe a repressão a grupos cívicos pró-democracia e de membros do partido de Tsvangirai, o Movimento por Mudança Democrática (MDC). As autoridades proibiram os comícios do partido, vêm prendendo funcionários do partido e colocaram policiais da tropa de choque nas ruas para impedir a realização de protestos.
As revoluções no norte da África assustaram a operação de espionagem controlada pelo partido de Mugabe. Dezenas de pessoas que estavam reunidas em fevereiro para assistir a reportagens na mídia sobre os levantes na Tunísia e no Egito foram presas e acusadas de traição.
As especulações recorrentes de que Mugabe estaria com câncer da próstata se intensificaram desde que ele viajou a Cingapura em fevereiro e março, ostensivamente para checapes médicos de rotina depois de uma cirurgia de catarata à qual foi submetido. Ministros do gabinete dizem que a lucidez de Mugabe continua intacta, mas que ele se cansa facilmente. Mesmo seus adversários políticos se perguntam se ele ainda terá anos de vida pela frente. Sua mãe viveu até os 100 anos.
"Não há nada que indique que ele esteja prestes a cair morto", comentou Theresa Makone, líder do partido de Tsvangirai.
Em uma entrevista rara à Reuters no ano passado, Mugabe descartou os rumores de que ele estaria perto de morrer. "Não sei quantas vezes já morri, mas nunca ninguém falou de minha ressurreição", afirmou.
Sob os termos da Constituição atual, se Mugabe morresse no exercício da Presidência, o Zanu-PF escolheria o presidente que concluiria seu mandato. Está previsto que os zimbabuanos votem uma nova Constituição antes da próxima eleição, mas a redação da Constituição desencadeou uma luta intensa entre os partidos. Recentemente, o deputado que lidera os trabalhos constitucionais pelo partido de Tsvangirai foi posto na cadeia por quase um mês.
Nos últimos dois anos, Mugabe vem compartilhando o poder com Tsvangirai a contragosto, em um chamado governo inclusivo.
Um líder sênior do Zanu-PF reconheceu que Tsvangirai é um adversário temível.
"Morgan vem se construindo há dez anos", falou, usando o primeiro nome de Tsvangirai. "Ele já disputou três eleições. Por isso, o receio é que ele esteja com ímpeto forte. Se o velho (Mugabe) se for, quem, entre nossos chamados líderes, será capaz de enfrentá-lo?"

Com reportagem de um jornalista em Zimbábue


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