São Paulo, segunda-feira, 24 de maio de 2010

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Policiais afegãos travam luta pessoal contra o vício

Por ROD NORDLAND e ABDUL WAHEED WAFA

CABUL, Afeganistão - O Hospital para Viciados do Ministério do Interior é, ao mesmo tempo, um sintoma da gravidade do problema da dependência de drogas no Afeganistão e uma possível solução para um de seus piores aspectos.
Por um lado, seus pacientes são todos policiais. Por outro, esses policiais não estão mais nas ruas, tentando alimentar seus vícios em heroína e ópio que podem custar o triplo de seus salários.
O general Dawood Dawood, líder do combate às drogas no país, está tão orgulhoso da instituição, que tem apenas três meses, que emitiu uma carta assinada por ele autorizando os repórteres a visitá-la recentemente.
Quando as autoridades do hospital reclamaram -dizendo que temiam que os policiais encarcerados ficassem tão irritados que poderiam atirar pedras nos visitantes-, a equipe do general interveio para garantir que a visita ocorresse.
Antes da excursão, Dawood disse em entrevista coletiva que um programa sistemático que até então havia administrado testes de urina a 95% da Polícia Nacional afegã encontrara 1.231 dependentes de drogas pesadas, a maioria de heroína e ópio -cerca de 1,5% da força.
O Afeganistão também tem uma grave escassez de policiais treinados. Por isso, em vez de demiti-los, começou a enviá-los para o Hospital para Viciados do Ministério do Interior para programas de reabilitação de três a quatro semanas.
Esses números não causaram surpresa. Um relatório do Departamento de Contabilidade do governo para o Congresso dos EUA, em março passado, salientou que 12% a 41% dos recrutas policiais afegãos deram positivo no teste para uso de drogas, embora este incluísse maconha e haxixe, além de opiáceos.
Os recrutas que dão positivo para drogas pesadas são descartados, mas os outros são mantidos e recebem orientação psicológica. Como os opiáceos desaparecem do corpo rapidamente, porém, muitos dos recrutas poderiam com facilidade ter evitado ser apanhados.
A maioria, como o primeiro-tenente Juma Khan Asak, 40, patrulheiro de fronteira, era dependente há muito tempo. Asak disse que fumou ópio e heroína a partir dos 17 anos. Agora que seu filho mais velho tem essa idade, ficou preocupado que ele pudesse segui-lo no vício. E se apresentou para o tratamento.
"Eu gastava mil afeganis por dia", ele disse, "e não conseguia mais fazer meu trabalho adequadamente". Essa quantia, cerca de R$ 36, era quase o dobro de seu salário de policial; perguntado como podia pagar isso e sustentar uma grande família, ele apenas encolheu os ombros.
Como os outros pacientes do hospital, Asak vestia pijamas listrados. Atualmente há 50 deles ao todo, dos quais 11 eram tenentes ou mais graduados.
As instalações são modestas, uma série de antigos prédios escolares e barracões pré-fabricados. Sem gerador, muitas vezes não há água corrente ou eletricidade.
Mas a proporção de pacientes para funcionários é a inveja de quase qualquer centro de reabilitação de drogas: ele tem 12 médicos, incluindo dois psiquiatras, assim como assistentes sociais e conselheiros.
Até agora, disse Doust Mohammed, psiquiatra e diretor médico da instituição, o hospital de cem leitos tratou 600 policiais; os outros 600 que deram positivo em testes nacionais deverão chegar aqui nos próximos meses. "Daqueles 600, apenas 2 tiveram recaída", disse Mohammed. Os que recaem são demitidos, disse.
Embora seja cedo demais para saber como os pacientes se sairão a longo prazo, o psiquiatra Shafi Azim disse que os policiais são pacientes especialmente bons. "Eles são militares e estão acostumados a receber ordens. E querem recuperar seu orgulho e sua dignidade."


Colaborou Sangar Rahimi


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