São Paulo, segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Texto Anterior | Índice

Cientistas malucos vão para a cozinha

Por JULIA MOSKIN

Qualquer cozinheiro que tenha tirado um bolo solado do forno ou tentado acelerar o cozimento de costelinhas já se deparou com as leis da ciência alimentar. E alguns dos chefs mais reverenciados da atualidade tratam a cozinha como laboratório.
Mas alguns cientistas profissionais (e uns poucos amadores) estão levando a pesquisa para uma direção diferente. Em vez de aromatizar mozarela com pétalas de rosas, eles enfiam garfos metálicos em salsichas e as cozinham por eletrocção. Esta subcultura se envolve em projetos grandes, barulhentos, perigosos, fumacentos, absurdamente demorados e aparentemente sem sentido —embora o processo seja tratado com grande solenidade.
Assim como um cozinheiro se baseia na memória gustativa e na experiência para saber o que falta no molho —acidez, açúcar, sal, gordura?—, esses cientistas se baseiam na experiência de laboratório e no treinamento acadêmico para responder a questões obscuras como: qual é a melhor maneira de arremessar marshmallows a grandes distâncias?
“Como em toda pesquisa, é questão de pegar um problema e pensar, pensar e pensar no que poderia ser usado para resolvê-lo”, disse Windell Oskay, engenheiro-projetista numa fábrica de instrumentos científicos.
Em sites como o Instructables.com e o Hungryscientist.com, pesquisadores comentam, auxiliam e incrementam o trabalho de seus colegas. Há diversos projetos, como um dry martini borbulhante de gelo seco (mexido em vez de agitado, para não explodir), uma melancia esculpida como um cérebro humano e uma abóbora transformada em câmera.
O engenheiro mecânico Patrick Buckley e a escritora Lily Binns reuniram 20 projetos de ciência gastronômica em um novo livro, “The Hungry Scientist Handbook” (“O manual do cientista faminto”, ed. Collins Living).
Há poucas semanas, Buckley levou vários litros de nitrogênio líquido para Austin, Texas, onde aconteceu a Maker Faire, evento anual da revista “Make”, voltada aos inventores de fundo de quintal. Seu projeto era o sorvete criogênico Microbatch: a mistura de um creme pesado com nitrogênio líquido, que se congela quase instantaneamente à temperatura ambiente, permitindo que o cliente crie seus próprios sabores de sorvete e os consuma ali mesmo. “O que eu aprendi na Maker Faire é que as pessoas nunca acham que suas próprias criações de sabor ficam ruins”, contou Buckley.
O sabor pode não ser o mais importante nesses projetos, mas não é irrelevante. Na tentativa de criar uma cobertura eletrocondutora para bolos de aniversário que substituíssem velas por lâmpadas tipo LED, Buckley e Binns experimentaram fazer uma cobertura com o gel que é espalhado sobre a pele humana antes da implantação de eletrodos em procedimentos médicos, como nos exames de resistência cardíaca. O gosto, segundo Binns, era simplesmente nojento.
A solução —em um dos projetos mais difíceis e heróicos contados no livro— está em cobrir o bolo com uma treliça de fios de alcaçuz, em que cada fio está envolto com prata comestível e uma guarnição tradicional em certos pratos.
A prata conduz a eletricidade de baterias, fazendo com que os LEDs se iluminem em diferentes cores, sem que haja gotejamento de cera, risco de incêndio ou preocupação em como levar o bolo à mesa sem apagar as velinhas antes da hora.


Texto Anterior: França vê cultura em sua culinária
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.