São Paulo, segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

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Washington

Um mundo de desafios

DAVID E. SANGER
ENSAIO

O mundo parecia muito diferente naquela sexta-feira de fevereiro de 2007, em que Barack Obama se postou diante do antigo Capitólio estadual em Springfield, Illinois, e se declarou candidato à presidência dos EUA.
A "escalada" no Iraque estava em suas primeiras semanas, e parecia difícil imaginar que, quando o próximo presidente assumisse o cargo, dali a 710 dias, haveria um consenso sobre o ritmo de uma retirada americana. As duas facções palestinas, Hamas e Fatah, falavam sobre um acordo para dividir o poder pacificamente.
O índice Dow Jones estava em 12.580 pontos e chegaria a 14 mil naquele verão. A General Motors ganhava dinheiro vendendo carros, embora relatasse certa preocupação com "hipotecas de segunda linha" detidas por sua divisão financeira. E a maior preocupação sobre a China e a Índia era que suas economias estivessem crescendo rápido demais e pudessem superaquecer.
Em suma, os desafios que Obama começará a enfrentar agora pouco se parecem com aqueles de dois anos atrás, quando ele admitiu que "existe uma certa presunção nisto -uma certa audácia- neste anúncio".
A agenda que ele se prepara para aprovar agora é significativamente diferente da que ele imaginava na época, em parte por opção mas principalmente devido às circunstâncias. Desde sua eleição, Obama falou cada vez menos sobre o Iraque e cada vez mais sobre estabilizar a economia mundial. Nos bastidores, sua equipe nacional correu para reavaliar as estratégias para Afeganistão, Gaza, Irã e Paquistão, mesmo antes de ligar seus computadores seguros na Ala Oeste.
"Ele enfrenta o problema clássico de ter de lidar com várias crises antes de ter realmente tempo para definir uma arquitetura de longo prazo", disse G. John Ikenberry, professor da Universidade Princeton em Nova Jersey que escreveu um estudo detalhado sobre a agenda de segurança nacional para quem se tornasse o próximo presidente. A ex-secretária de Estado Madeleine Albright disse recentemente que a tarefa de Obama é comparável a "redesenhar o avião em pleno voo".
Mas a realidade em mutação fez mais que forçar uma mudança de foco. Também levou Obama a examinar suas teorias sobre uma série de questões, apurar suas ideias e buscar novos assessores, alguns deles vindos da campanha de Hillary Clinton nas primárias presidenciais.
No que se trata de segurança nacional, seus assessores veem uma mudança sutil mas clara nos últimos anos, abrindo-o para a influência de conselheiros bem mais ao estilo "falcão" do que ele parecia dois anos atrás. Um homem diferente enfrenta um mundo de desafios

Mas assessores que estão com Obama desde que ele chegou ao Senado dizem que suas opiniões não mudaram tanto quanto alguns seguidores e comentaristas progressistas afirmam. Desde o dia de 2002 em que ele se declarou contrário à guerra no Iraque, Obama disse que não é contra todas as guerras. E em certas questões, incluindo a de atacar alvos terroristas no Paquistão, ele às vezes esteve à direita tanto dos democratas quanto dos rivais republicanos.
Dois anos atrás, as opiniões de Obama sobre o Iraque dominavam as manchetes quando ele começou a campanha enfatizando suas diferenças em relação a Hillary. Então teria sido difícil imaginar que ele pediria que o secretário da Defesa do presidente Bush, Robert Gates, continuasse no cargo.
Em março, Obama começou a falar sobre o Irã como o país que "representa o maior desafio para os interesses americanos no Oriente Médio em uma geração" e prometeu, alguns meses depois, que nunca deixaria o país obter uma arma nuclear.
Sua abertura em muitas opiniões sobre segurança nacional tornou-se mais pronunciada a cada comunicado presidencial e com um exame mais apurado das Estimativas de Inteligência Nacional, que sua equipe diz que ele lê com certo ceticismo, não apenas por causa do que as agências de inteligência erraram na escalada à guerra do Iraque.
"Ele aborda os relatórios da inteligência da mesma maneira que muitas coisas que lê, seja uma matéria no 'New York Times' ou um relatório de campo", diz Denis McDonough, antigo assessor de política externa que muitas vezes foi encarregado de encontrar respostas às perguntas de Obama. Ele afirma que os que pensam que Obama derivou para opiniões mais belicistas não estavam escutando o que ele dizia sobre o Irã, o Paquistão e o Hamas durante a campanha.
Uma autoridade que deverá ocupar um alto cargo no governo e não quis ser identificada disse: "Todo o mundo se concentrou na disposição dele para envolver os iranianos em conversações diretas e foi a coisa certa a fazer. Mas não escutaram a parte que diz que, se os iranianos não vierem à mesa, ele está preparado para cortar sua gasolina e espremê-los com sanções".
Obama renovou sua promessa de lidar diretamente com os iranianos, algo que Bush só permitiu recentemente em um nível inferior de governo. Clinton, que certa vez citou os pedidos de envolvimento em alto nível de Obama como um exemplo de sua inexperiência, agora será encarregada desse esforço.
Mas a iniciativa deverá ser complicada pelo fato de que Bush está transmitindo para seu sucessor um esforço amplo e oculto para solapar o programa nuclear iraniano, um dos muitos programas secretos de que Obama foi informado recentemente e logo terá oportunidade de confirmar, modificar ou cancelar.


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