São Paulo, segunda-feira, 29 de agosto de 2011

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Na China, atletas se rebelam

Jovens desafiam treinadores, em mídias sociais

Por DAN LEVIN

PEQUIM - Uma série de recentes polêmicas revela como jovens atletas chineses, outrora obedientes embaixadores em busca da glória patriótica, estão começando a expor abusos, a desafiar explorações e a rejeitar a interferência oficial nas suas carreiras.
A luta deles é um microcosmo do choque existente na China contemporânea entre o impulso pela liberdade pessoal e o controle de um governo autoritário.
Mas os atletas enfrentam um adversário formidável: a burocracia estatal das escolas de formação, equipes e organizações que selecionam e treinam mais de 250 mil jovens com o objetivo de conquistar medalhas de ouro.
Alguns atletas descobrem que os anéis olímpicos se tornam grilhões que os mantêm durante anos num regime de servidão a um governo que frequentemente negligencia a sua educação escolar e ignora suas lesões, ao mesmo tempo em que se apropria de uma fatia considerável dos seus ganhos a todo mês.
Segundo a imprensa estatal, 240 mil atletas aposentados enfrentam com frequência lesões, pobreza e desemprego.
A tenista Li Na, 29, foi forçada a escolher entre sua carreira e o seu país em 2008, quando deixou a equipe nacional, já que as autoridades não aceitavam abrir mão do controle sobre sua vida.
"Quando eu estava na equipe nacional, o Estado escolhia o meu treinador e decidia quais torneios eu disputava", disse ela.
Em junho, ela venceu o Aberto da França, tornando-se a primeira tenista da Ásia a conquistar um título do Grand Slam.
Agora independente, ela tem de pagar até 12% dos seus ganhos ao governo, menos do que os 65% habitualmente cobrados.
Castigos físicos há muito tempo são utilizados pelos treinadores na China como forma de impor um rigoroso código de disciplina. Na Rússia, durante os anos soviéticos houve o mesmo.
Mas uma mudança está começando, segundo Li, graças em parte à crescente presença de treinadores estrangeiros. "Eles têm uma inflência sobre os atletas, que veem que existe outra maneira de fazer as coisas", afirmou.
Quando Bob Donewald Jr., ex-assistente da NBA, começou a treinar a equipe do Shanghai Sharks, há dois anos, uma das primeiras coisas que ele fez foi acabar com o toque de recolher do time e com a prática de verificar se os atletas estavam na cama.
Hoje técnico da seleção nacional, Donewald recebeu ordens de manter o toque de recolher, mas angariou o respeito de jogadores e dirigentes por usar a comunicação ao invés da intimidação.
"Acho que mostrei a esses caras que você pode questioná-los duramente num momento, e em seguida passar o braço em volta deles. Não é preciso esmagá-los o tempo todo."
Se por um lado o governo está lentamente soltando as amarras sobre as vidas dos atletas profissionais, por outro parece menos disposto a abrir mão do controle financeiro.
Os atletas têm de entregar parte dos seus rendimentos aos dirigentes, que argumentam que os esportistas precisam reembolsar o sistema pelos anos de treinamento recebido.
Yao Ming foi obrigado a dar até 8% do total de rendimentos da sua carreira na NBA ao governo chinês, que então vendeu os direitos sobre a imagem dele, sem sua autorização, para a Coca-Cola, apesar de ele ter contrato com a concorrente Pepsi.
Shen Jian, 23, um dos principais ciclistas de BMX da China, recentemente assinou um contrato de patrocínio exclusivo com a marca de roupas Vans.
Mas a Associação de Esportes Radicais da China (AERC) o proibiu de disputar os X Games da Ásia, em Xangai, se ele não usasse uma camiseta com o logotipo do patrocinador oficial chinês, o que levaria ao cancelamento de seu contrato com a Vans. Shen se recusou a cooperar.
"A AERC não me ensinou nada", disse Shen. "Eu não preciso usar as roupas deles para que possam ganhar dinheiro e me explorar."

Contribuiu Adam Century


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