São Paulo, segunda-feira, 30 de março de 2009

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Ante a recessão, turistas fogem para South Beach

Por RUTH LA FERLA

MIAMI - Nas últimas semanas, inevitavelmente, o declínio econômico vem modificando a paisagem e o espírito animado de Miami. Muitos dos hotéis elegantes que ladeiam a avenida Ocean Drive só têm 66% de seus apartamentos ocupados, e a escalada dos aluguéis e a desaceleração das vendas obrigaram muitas butiques e restaurantes a deixar a Lincoln Road Mall, rua de oito quadras para pedestres que é o centro da cidade de South Beach.
Fica claro que a recessão lançou sua sombra sobre este lugar. Mas não é uma sombra suficientemente comprida para ter desanimado muitos dos visitantes, que ainda vão a South Beach em busca de uma fuga da rotina. No ar lânguido da cidade e tendo os hotéis de cor pastel e estilo Art Deco no segundo plano, muitos turistas ainda querem dar vazão a seu lado hedonista. Os turistas continuam a chegar de Nova York e Atlanta, Buenos Aires e São Paulo, lotando clubes, restaurantes, piscinas e butiques. Segundo as cifras mais recentes do Birô de Convenções e Visitantes local, 12,1 milhões de turistas visitaram Miami e Miami Beach no ano passado.
"As pessoas estão tomando vodca em lugar de champanhe, mas continuam a vir", comentou Roman Jones, dono do Opium Group, proprietário de clubes norturnos da moda. Não obstante a recessão, disse Jones, cerca de 15 mil pessoas passam por suas discotecas todas as noites. "Elas vêm para descontrair, e, se gastar US$ 5.000 em duas noites as faz esquecer que já perderam mais de US$ 5 milhões, então, para elas, vale a pena", disse Jones. "Elas estão recordando uma era que já passou, mas da qual não querem se desligar." No Louis Bar, a dentista Adriana Leone, com consultório em Wall Street, explicou: "Vim porque o clube é novo, mas sobretudo porque precisava me afastar da atmosfera deprimente de Nova York neste momento".
Leone é uma das muitas turistas que veem Miami Beach como lugar para fugir de tudo, para livrar-se das inibições -fiscais ou outras- que as limitam em casa. Desta vez, o fluxo normal de visitantes de Nova York, América Latina e Europa ganhou um acréscimo: visitantes russos endinheirados. "Na primeira semana de janeiro, tivemos tanto movimento quanto no mês inteiro de janeiro do ano passado, e foram todos russos", contou Roma Cohen, sócia de uma butique na Lincoln Road.
"Aliás, os russos são os únicos que estão comprando sem pedir desconto." Cohen pode estar se dando bem, mas esse não é o caso de outros varejistas, que relatam uma queda de até 20% nas vendas. Nos dias úteis e em alguns finais de semana, o trânsito na Lincoln Road às vezes mingua para quase nada. Mead Dunevant, gerente assistente da Fly Boutique, que vende roupas "vintage", reclamou: "Está tudo morto por aqui. As pessoas não estão gastando como gastavam. Sobra menos para os moradores locais."
Os indicadores econômicos mais amplos indicam que o boom de Miami esfriou. A queda nos preços e o número crescente de imóveis à venda situam Miami e Miami Beach na liderança da crise imobiliária americana. De acordo com o analista imobiliário Michael Cannon, os preços de imóveis residenciais estão entre 15% e 25% abaixo do pico alcançado em 2004. Nos últimos seis anos, uma onda de construção gerou hotéis como Setai e Fontainebleau, que no ano passado passou por uma reforma geral de US$ 500 milhões. Michael Capponi, um construtor local, opinou: "Acho que estamos firmes por enquanto. Há investimentos demais aqui para que tudo caia por terra".
Numa noite recente de sexta-feira, a atividade incessante nos restaurantes e clubes noturnos sugeria que a afirmação de Capponi pode ter fundamento. No Prime 112 em Ocean Drive, um dos cinco restaurantes de Myles Chefetz em South Beach, a fila de pessoas que aguardavam uma mesa saía para a rua. Dentro do restaurante, os fregueses saboreavam filés de US$ 79. Chefetz disse que no ano passado o movimento no Prime 112 subiu 5% em relação a 2007. Ele atribuiu o fenômeno a pessoas "que gostam de agir como ricas por uma noite". "Isto aqui não é Nova York", ele ponderou. "Aqui, gastar dinheiro não é visto como sinal de mau gosto."


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