São Paulo, segunda-feira, 30 de maio de 2011

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LENTE

Uma abordagem manual na sociedade americana

Em 1961, a Chevrolet patrocinou um filme de 30 minutos que elogiava a criatividade e o know-how técnico do país. "Dentre todas as coisas, os americanos são fazedores", entoava o narrador, tendo ao fundo a imagem de meninos construindo um castelo de areia. "Com nossas forças, nossas mentes e nossos espíritos, coletamos, formamos e moldamos: fazedores, formadores e montadores. Nós começamos cedo..."
Uma das lições que economistas tiraram da crise de 2008 foi que os EUA tinham abandonado suas raízes como usina manufatureira em nome dos benefícios esotéricos e questionáveis da pirotecnia financeira.
Ayah Bdeir, 28, tinha um lugar na primeira fila do filme, ela disse à revista do jornal "The New York Times". Era uma consultora de software financeiro, trabalhava em um escritório elegante em Manhattan e vendia software para trocas de crédito por dívida, um dos complexos instrumentos que ajudaram a arruinar a economia global. Ganhava muito dinheiro e estava infeliz.
Bdeir se demitiu. Ela queria fazer coisas e, sob a objeção veemente de sua mãe e de amigos, tornar-se uma fabricante da nova era. Em parte, foi para lavar a vergonha que sentia.
"Eu me senti culpada por algum tempo", ela disse. "Tenho três diplomas, falo três línguas, orgulho-me do meu pensamento científico e matemático -como não poderia ter entendido as dimensões sociais, econômicas e políticas daquilo em que eu trabalhava e que acabou arruinando o mundo?"
Com um colega, Bdeir teve a ideia de fazer componentes eletrônicos em tijolos parecidos com os do Lego, cheios de circuitos, sensores, painéis solares e motores, que podem ser montados para criar máquina básica -por exemplo, bateria ligada a uma lâmpada e um sensor de pressão que pode acendê-la ou apagá-la. Ela transformou o projeto em empresa e vende kits por US$ 99, chamados littleBits, para as pessoas fazerem seus gadgets.
Programas que ensinam crianças de apenas cinco anos a usar ferramentas e construir coisas como barcos, casas nas árvores e cabanas de troncos surgiram por todo o país. Alguns pais parecem perceber que a capacidade de empunhar um martelo é tão importante quanto digitar em um telefone celular.
"Existe um despertar geral, com certeza", disse ao "Times" Doug Stowe, 62, um antigo carpinteiro e educador no Arkansas. "Até o início dos anos 1900, havia uma compreensão generalizada de que o uso das mãos é essencial para o desenvolvimento do caráter e do intelecto. Mais recentemente, tivemos essa ideia de que toda criança deveria ir para a faculdade, e que o preparo para profissões em artes manuais não é mais necessário."
Há sinais de que um renascimento ocorre em escala maior.
O Boston Consulting Group diz que empresas, como a gigante de equipamentos de construção Caterpillar, que antes transferiram sua produção para o exterior, agora estão voltando. Ao mesmo tempo, empresas de outros países, especialmente europeus, deslocam a produção para os EUA, escreveu Paul Krugman recentemente no "Times".
Ele advertiu que a recuperação da indústria manufatureira não é robusta, mas fabricantes de carros, como GM e Ford, superaram a tempestade e estão crescendo de novo.
"Assim, enquanto ainda temos uma economia profundamente perturbada", ele escreveu, "uma boa notícia é que os americanos estão recomeçando a fazer as coisas." Mais uma vez, a América poderá se tornar uma nação de hábeis fabricantes.

TOM BRADY

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