São Paulo, segunda-feira, 30 de maio de 2011

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Uma molécula pequena e atarefada

Por NATALIE ANGIER
Os pesquisadores, recentemente, descobriram que a serotonina desempenha um número impressionante de papéis cruciais no corpo todo, inclusive na reconstituição óssea. Quando, por exemplo, usava-se uma droga para reduzir a serotonina em ratos com osteoporose, os ossos dos animais eram quase totalmente restaurados.
Os cientistas perceberam que a serotonina começa a exercer influência no útero, escoando da placenta da mãe para o prosencéfalo [parte frontal do cérebro] embrionário durante o primeiro trimestre da gravidez, segundo Pat Levitt, do Instituto Neurogenético Zilkha, da Universidade da Califórnia.
"Se eu não admitisse que me surpreendi com a abrangência da função da serotonina e com sua importância para tecidos como os ossos, eu estaria mentindo", disse Patricia Ducy, que estuda o efeito da serotonina sobre a biologia óssea no Centro Médico da Universidade Columbia, em Nova York.
A serotonina é uma molécula pequena, detectada pela primeira vez em 1948 no soro sanguíneo, e que demonstrou possuir propriedades vasoconstritoras. Cinco anos depois, os cientistas encontraram a serotonina também em extratos cerebrais e, logo, descobriram que a recém-inventada droga alucinógena LSD interferia no sistema cerebral da serotonina.
Para sintetizar a serotonina, os seres humanos e outras espécies precisam começar com triptofano, um aminoácido essencial encontrado em muitos itens alimentares, como peru, queijo, tofu, castanhas, sementes e bananas.
Esforços vêm sendo dedicados ao estudo da ação cerebral da serotonina, lugar em que funciona como um neurotransmissor.
"É uma molécula envolvida em ajudar a lidar com a adversidade, a fazer com que a pessoa não perca o controle, persistindo e resolvendo tudo", disse Philip Cowen, especialista em serotonina da Universidade de Oxford e do Conselho de Pesquisa Médica. Distúrbios nesse sistema podem causar depressão, ansiedade e ataques de pânico. O Prozac e outros medicamentos ditos "inibidores seletivos de recaptação da serotonina" bloqueiam o transporte da serotonina para permitir que o neurotransmissor ofereça seu estímulo a qualquer receptor que o possua. Mas uma classe mais nova de antidepressivos, como o Viladozone, vai mais longe, interferindo em um ou mais dos 15 diferentes receptores de serotonina, uma abordagem que pode aumentar a eficácia da droga. Outra parte importante das pesquisas com a serotonina considera seu papel como hormônio que dá forma aos tecidos. Na última edição da revista "Nature", Levitt e seus colaboradores descreveram estudos mostrando que, mais ou menos a partir do décimo dia de gestação, o prosencéfalo de ratos era inundado com serotonina. Os pesquisadores já haviam reunido provas de que a serotonina estimulava o crescimento de novas conexões neurais. Mas qual seria a origem dessa serotonina? Os cientistas a localizaram na placenta.
A vasta maioria da serotonina no organismo é sintetizada fora do cérebro, principalmente pelo intestino. Os dois estoques de serotonina são estritamente segregados, mas novas pesquisas sugerem que os ossos tiram proveito de ambos os circuitos, para gerenciar a delicada dança entre suas duas castas celulares: os construtivos osteoblastos, que formam o esqueleto, remendam os buracos e consertam as rachaduras, e os destrutivos osteoclastos arrancam as lascas dos tecidos ósseos envelhecidos.
Como descrevem Ducy, Gerard Karsenty e seus colegas no "Journal of Cell Biology" e na "Nature Medicine", a serotonina no intestino impede os osteoblastos de produzirem novos ossos. Em experimentos com ratos sofrendo de osteoporose grave, os pesquisadores mostraram que, se eles usassem uma droga para reduzir em 40% a produção de serotonina do intestino, eles liberavam os construtores osteoblásticos dos animais de tal maneira que esqueletos ocos eram reparados até ficarem robustos como novos.
"Não encontramos nenhum efeito colateral no tratamento", disse Ducy.


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