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OMBUDSMAN
O espaço das idéias
MARCELO BERABA
Os jornais estão cobrindo o
conturbado cenário nacional com o foco em dois aspectos:
as acusações de corrupção, bem
como as investigações que elas
suscitam, e a crise política do governo Lula.
Cobrem bem? Caminham com
dificuldades naturais na investigação jornalística (sempre difícil
quando se trata de corrupção),
dependem quase completamente das doses regulares de acusações administradas pelo deputado Roberto Jefferson e pecam, seriamente, na minha opinião,
quando relutam em abrir espaço
para as versões dos acusados.
Tratei disso na Crítica Interna
de quinta-feira. É inexplicável
que a Folha, tendo feito a terceira entrevista com Jefferson na
noite de terça-feira para publicá-la na edição de quinta, não se
tenha disposto, na quarta, a checar algumas informações passadas com tantos detalhes e a ouvir
os deputados e funcionários do
governo envolvidos nas novas
denúncias sobre Furnas. Seguramente não faltaram tempo nem
equipe para esse trabalho de checagem e para as entrevistas.
Esses procedimentos deveriam
fazer parte da rotina do jornal e,
nesta altura da cobertura, não
vejo argumentos que possam
justificar esquecê-los. A exposição destacada das várias versões
para os casos que ainda estão
obscuros é um direito dos acusados e dos leitores.
O terceiro aspecto
Há, entretanto, um terceiro aspecto desta crise que tem sido
mal trabalhado ou, simplesmente, deixado de lado, que é a avaliação da sua origem e das suas
raízes institucionais, assim como
o debate que a busca de saídas
para a governabilidade e a
transparência engendra.
O papel dos jornais estará
completo quando, além de relatarem e investigarem, se dispuserem a abrir suas páginas para o
debate regular sobre o futuro do
modelo político que estamos
construindo. Não é um debate
acadêmico, embora assim pareça por estar hoje restrito aos colunistas, aos articulistas e às edições especiais de fim de semana.
O Congresso está prestes a
aprovar o que vem sendo chamado de reforma política, que
abrange quatro pontos: fidelidade partidária, lista fechada de
candidatos, cláusula de barreira
para limitar o número de partidos e financiamento público de
campanhas.
Não há consenso sobre esses
assuntos. Há, no entanto, uma
impressão generalizada entre os
que acompanham a cena política brasileira de que esses pontos
não resolverão os problemas de
governabilidade e, menos ainda,
os de corrupção e de impunidade.
A Folha já deu a sua opinião
sobre a reforma que está para ser
aprovada. O título do editorial
do domingo, dia 26, resume o
que o jornal defende: "Reforma
equivocada". Isso não significa,
no entanto, que o jornal deva relegar o debate. Ao contrário. Esta é a hora de abrir suas páginas
para um debate sistemático,
aprofundado e, principalmente,
pluralista sobre o país.
A discussão está restrita, até
agora, aos artigos de sábado publicados na seção "Tendências/
Debates", às "Entrevistas da 2ª"
e, esporadicamente, ao caderno
Mais! (como foi no domingo passado) ou a algum debate especial
em Brasil. É pouco, porque não
abarca o conjunto de problemas
que está em jogo nem a diversidade de diagnósticos, análises e
sugestões disponíveis.
Não me refiro apenas a dar espaço às opiniões dos especialistas
e dos políticos, mas a contemplar
os movimentos e organizações
sociais e a trazer o cidadão comum, o leitor do jornal, para a
discussão. A decepção com a política e com os políticos não é
uma novidade entre nós. Mas
não há dúvida de que a frustração e o ceticismo aumentaram
com os últimos escândalos. A
sensação de que está tudo errado
e de que nada dá certo transforma-se rapidamente na certeza
de que não há solução.
Os meios de comunicação têm
a obrigação de investigar com rigor e de cobrir com lupa os bastidores da crise, mas esses deveres
não devem servir de pretexto para deixar em branco o espaço do
debate e das idéias.
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Marcelo Beraba é o ombudsman da Folha desde 5 de abril de 2004. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
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