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IMPRENSA NA BERLINDA
A valorização das minúcias
A antropóloga Carla Teixeira
é professora da UnB (Universidade de Brasília), especializou-se em antropologia da política e tem um livro, "A Honra
da Política" (Relume Dumará,
1998), em que analisa os processos de cassação de mandato
no Congresso Nacional por
quebra do decoro parlamentar
entre 1949 e 1994. A seguir, a
análise que faz do papel da imprensa na cobertura da atual
crise política.
"Julgo da maior importância
as investigações feitas pelos
jornalistas ou por eles divulgadas, mas avalio que há uma
fronteira tênue entre investigação e noticiário policial, havendo por vezes uma supervalorização de minúcias factuais
que, curiosas e interessantes,
freqüentemente pouco acrescentam à compreensão da
complexidade dos acontecimentos. Assim, por um lado,
alimentam uma cultura dos
"escândalos", dos "casos" e dos
"episódios" que obscurecem as
continuidades e rupturas entre
eles; e, por outro, supervalorizam a especificidade da política brasileira, sem compará-la à
de outras democracias.
A importância da investigação feita pela imprensa parece
vir decrescendo desde o caso
Collor e a CPI do Orçamento.
Tenho a impressão, valeria
checar, de que no processo que
levou à punição do então senador Luiz Estevão e do juiz Nicolau, diferentemente dos processos anteriores, foi o Ministério Público quem se destacou. Já agora, a Polícia Federal
tem contribuído de maneira
crucial para o bom andamento
das investigações no Congresso. Não quero dizer que a imprensa não se faça presente,
mas que há outras instituições
que, devido ao avanço do sistema democrático, podem cumprir este papel tão bem ou melhor do que ela.
Contudo, a função de mediação lhe é especialmente cara.
Principalmente, se considerarmos que parece estar havendo
um esvaziamento das organizações que tradicionalmente
realizariam esta mediação (como sindicatos e partidos). Não
sei se os jornalistas se dão conta disso, mas hoje as relações
entre políticos dos diferentes
Poderes e o conjunto dos cidadãos vêm se consolidando
muito mais por via da imprensa e do chamado governo eletrônico. Acho fundamental refletirmos sobre as possíveis
conseqüências deste processo
para as relações de poder, de
decisão e de participação.
Por fim, creio que a imprensa, ciente da delicadeza do momento, tem revelado maturidade e raramente vi manchetes sensacionalistas. Tenho a
impressão de que a dimensão
institucional que esta crise adquiriu contribui para tal atitude. Se em momentos anteriores a crise era encarada como
conseqüência de falha moral
dos envolvidos, hoje claramente tem sido debatida como
fraqueza das estruturas democráticas no país. Não se trataria
tanto de um problema de corrupção individual ou de honra,
mas sim de corrupção institucional e de ética."
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