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OMBUDSMAN
A CPI e a imprensa
MARCELO BERABA
A aprovação do relatório
final da CPI dos Correios,
na quarta-feira, é um bom pretexto para iniciar uma avaliação do trabalho da imprensa na
cobertura desses dez meses de investigações e crise política.
Ao longo desse período, fiz diversas críticas aos jornais, particularmente à Folha. Publico hoje, e prosseguirei nas próximas
colunas, as avaliações que solicitei a alguns observadores do ambiente político e do comportamento da imprensa. Inicio com
três cientistas políticos.
Encaminhei para eles quatro
questões que se completam:
Como avalia a cobertura da
imprensa no caso das denúncias
de corrupção no governo Lula e
no Congresso? Ela cumpriu o
papel que dela se espera numa
democracia? Que pontos destaca
como positivos na cobertura? E
negativos?
As respostas.
GRUPOS DE PRESSÃO
Wanderley Guilherme dos Santos, cientista político, pró-reitor da Universidade Cândido Mendes
"Jornalismo é uma das atividades dos órgãos de imprensa. Esses também agem como corporações econômicas e grupos de
pressão política. Em decorrência
de seus interesses econômicos e
políticos, a cobertura jornalística
da imprensa foi altamente positiva no que revelou, cúmplice no
que encobriu e facciosa no que
deturpou. Enquanto a imprensa,
como jornalismo, empresa e grupo político, depender tanto do
governo, vai continuar assim."
DECEPÇÃO DO FINAL
Jairo Nicolau, cientista político, pesquisador da Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro)
"A cobertura da imprensa teve
grandes momentos, como as
duas entrevistas de Roberto
Jefferson na Folha e algumas
reportagens especiais nas revistas semanais e no "Globo". Mas a
minha impressão é que, em
termos de difusão de informação, as matérias muitas vezes
correram atrás dos blogs e da cobertura ao vivo na TV, dois concorrentes e tanto.
Minha decepção maior se
deveu à cobertura do relatório
final, provavelmente ofuscado
pela saída do ministro Palocci
na mesma semana. Percorri
os principais jornais e encontrei
resumos modestos e análises
muito superficiais. Pouca gente
deve ter tido a paciência de ler
as centenas de páginas do relatório, mas creio que ele apresenta
um retrato poderoso de como
áreas significativas do Estado
brasileiro foram dominadas
pela corrupção."
ALARME DE INCÊNDIO
Fernando Luiz Abrucio, cientista político e professor da FGV(SP) e da PUC(SP)
"É possível analisar o papel da
imprensa sob três aspectos. Primeiro, ela cumpriu um excelente
papel de alarme de incêndio,
acompanhando com detalhes as
denúncias, os conflitos políticos
subjacentes à crise e os resultados do processo -com destaque
para a boa cobertura sobre as
cassações e as absolvições.
Em segundo lugar, a qualidade da investigação feita pela mídia foi razoável. Alguns furos
jornalísticos foram mal apurados, certas denúncias se perderam ao longo do tempo e, o pior
de tudo, ninguém foi atrás dos
possíveis mensaleiros, isto é, dos
mais de 50 deputados que a base
governista ganhou do dia para a
noite. Também não houve críticas mais sistemáticas e consistentes às apurações feitas pelas
CPIs, tomando como verdade
assuntos mal analisados pelos
parlamentares. Apesar disso, as
descobertas da imprensa foram
fundamentais para as linhas
mais profícuas de investigação,
da célebre entrevista de Roberto
Jefferson, passando pelos saques
no Banco Rural e chegando às
matérias de "Veja" e "Época" sobre as lambanças do ex-ministro
Palocci.
A maior falha da imprensa diz
respeito à análise das causas da
crise. A mídia se mostrou, no geral, despreparada para informar
ao leitor o que origina fenômenos como o "valerioduto" e o caixa dois. Deveriam ter sido discutidos temas como profissionalização da gestão pública, carreira
política clientelista da maioria
dos deputados, vigência de monopólios estatais que favorecem
a captura dos recursos públicos
por entes privados e falta de preparo dos congressistas para o
trabalho de investigação.
Os principais jornais foram
omissos em relação à forma como a CPI dos Bingos burlou regularmente as leis e ultrapassou
seus limites constitucionais. Para recuperar o padrão ético no
país, é preciso aperfeiçoar as instituições, e não criar um tribunal
inquisitório que transforma a
política e a apuração da vida de
cidadãos num jogo de vale-tudo.
Num balanço final das CPIs,
a imprensa deveria mostrar
que as regras que permitiram o
"valerioduto" e afins permaneceram, sobrando um legado de
fraca investigação parlamentar
e de abuso das prerrogativas
congressuais."
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