São Paulo, domingo, 09 de abril de 2006

Texto Anterior | Índice

Jornalistas e jornalistas

Não está comprovada a participação do ex-assessor de imprensa do Ministério da Fazenda, Marcelo Netto, no vazamento do extrato bancário do caseiro Francenildo Costa. Mesmo assim, seu advogado, Eduardo Toledo, adiantou a defesa com uma tese polêmica. Reproduzo o relato da Folha, publicado na quinta-feira.
"Em entrevista após a passagem de Netto na Polícia Federal, Eduardo Toledo desenvolveu o raciocínio segundo o qual jornalistas que exercem funções públicas respondem também ao código de ética da profissão. "O Marcelo é um jornalista e jornalistas têm o dever de informar"."
Não sei se o ex-assessor participou ou não, e em que medida, da conspiração contra o caseiro. Mas é certo que o seu advogado, ao tentar criar uma justificativa ética para o caso de ele ter vazado a informação, além de indiretamente incriminá-lo, cometeu um equívoco e mexeu com um vespeiro. Jornalistas de assessorias de imprensa não têm os mesmos objetivos nem respondem aos mesmos princípios dos que trabalham em meios de comunicação.
Algumas questões. Um jornalista no cargo de assessor deve agir em função dos interesses de quem o contrata (seja empresa privada, seja órgão público) ou deve permanecer compromissado com a função de "divulgar todos os fatos que sejam de interesse público" (Código de Ética dos jornalistas), mesmo os que não sejam do interesse de quem assessora? Um assessor de ministério que tem acesso a informações estratégicas deve agir como assessor e preservar a reserva ou deve agir como repórter e passar a informação adiante? Há justificativa ética para o vazamento de uma ilegalidade para proteger um ministro sob acusações?
Para colocar lenha nessa fogueira, copio um trecho do livro "Sobre Ética e Imprensa" (Companhia das Letras), do jornalista Eugênio Bucci, hoje na presidência de um órgão federal, a Radiobrás.
"O assessor de imprensa é um artífice e ao mesmo tempo um divulgador da boa imagem daquele que o contrata. Na prática, não é jornalista. Jornalista é estritamente o profissional encarregado de levar notícias ao público, num serviço que atende, no fim da linha, o titular do direito à informação e mais ninguém. O assessor de imprensa -ainda que possa ter se formado numa faculdade de comunicações com habilitação em jornalismo, ainda que tenha anos de experiência numa redação- exerce tecnicamente um ofício diferenciado. Ele não ganha para perguntar o que o público tem o direito de saber, mas ganha para propagar aquilo que o seu cliente (ou empregador) tem interesse em difundir.
São duas ocupações igualmente dignas, nada de errado com uma ou com a outra, mas são duas ocupações diferentes. Por vezes, opostas."


Texto Anterior: A CPI e a imprensa
Índice


Marcelo Beraba é o ombudsman da Folha desde 5 de abril de 2004. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Não pode ser demitido durante o exercício da função e tem estabilidade por seis meses após deixá-la. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva dos leitores, recebendo e verificando suas reclamações, e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
Cartas: al. Barão de Limeira 425, 8º andar, São Paulo, SP CEP 01202-900, a/c Marcelo Beraba/ombudsman, ou pelo fax (011) 3224-3895.
Endereço eletrônico: ombudsman@uol.com.br.
Contatos telefônicos: ligue (0800) 15-9000; se deixar recado na secretária eletrônica, informe telefone de contato no horário de atendimento, entre 14h e 18h, de segunda a sexta-feira.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.