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São Paulo, domingo, 31 de agosto de 2003

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OMBUDSMAN

Teoria e prática

BERNARDO AJZENBERG

Recorro mais uma vez ao "Manual da Redação" da Folha. Diz, na página 62, o verbete "Didatismo":
"Qualidade essencial do jornalismo e um dos objetivos básicos do Projeto Folha. Todo texto deve ser redigido a partir do princípio de que o leitor não está familiarizado com o assunto. Explique tudo de forma simples, concisa, exata e contextualizada."
Isso é a teoria. Eis, agora, algumas práticas, consideradas apenas edições da semana passada:
1) Reportagem sobre declarações dadas a respeito da América Latina pelo economista norte-americano John Williamson, um dos criadores do "Consenso de Washington", não explicava o que significa esse "consenso";
2) Relato com afirmações do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, nas quais ele citava os poetas João Cabral de Melo Neto e Carlos Drummond de Andrade, ambos já mortos, não trazia aqueles parênteses com os anos de nascimento e de morte dos poetas, dando a entender, para leitores menos esclarecidos no assunto, que ambos ainda vivem (ou, para os esclarecidos, que o jornal acha que eles ainda vivem);
3) Reportagem informando que o governo prorrogou o prazo de inscrição para financiamento de estudos mencionava a aplicação da Tabela Price, sem explicar o que isso quer dizer nem indicar como fazer para sabê-lo;
4) Idem para outro texto, sobre saúde, no qual aparecia a sigla Sars, igualmente sem registro sobre seu significado;
5) No noticiário de sexta-feira sobre o caso de corrupção de menores em que são acusados políticos e "notáveis" de Porto Ferreira (SP), não havia nenhum mapa a mostrar para o leitor onde fica essa cidade;
6) Ao fazer referência às chacinas da Candelária e de Vigário Geral, no Rio, uma reportagem sobre documento da Anistia Internacional não incluía nenhuma "memória" a respeito do que foram esses eventos.
Um dos trunfos que diferencia o jornal de outros meios de comunicação é sua capacidade de permitir maior aprofundamento de temas e acessibilidade, para o leitor, ao conteúdo do que se está falando (no caso, escrevendo).
Ao abrir mão disso ou ao relegar a segundo plano essa "qualidade essencial do jornalismo", a Folha não só deixa de cumprir aquilo que seu próprio "Manual" indica como corre o risco de alimentar em muita gente (em especial os mais jovens) a sensação de que, havendo TV, rádio e internet, o jornal impresso talvez não seja tão indispensável quanto parece.


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Bernardo Ajzenberg é o ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade por seis meses após o exercício da função. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva do leitor -recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário dos meios de comunicação.
Cartas: al. Barão de Limeira 425, 8º andar, São Paulo, SP CEP 01202-900, a/c Bernardo Ajzenberg/ombudsman, ou pelo fax (011) 224-3895.
Endereço eletrônico: ombudsman@uol.com.br.
Contatos telefônicos: ligue (0800) 15-9000; se deixar recado na secretária eletrônica, informe telefone de contato no horário de atendimento, entre 14h e 18h, de segunda a sexta-feira.

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