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São Paulo, quinta-feira, 01 de janeiro de 2004

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CLÓVIS ROSSI

Autonomia para errar?

SÃO PAULO - Como é que alguém pode, em sã consciência, pensar em autonomia para o Banco Central se o BC não acertou uma maldita previsão em 2003?
Para começar, a principal delas, relativa ao nível de atividade econômica: a previsão inicial (janeiro) era de um crescimento de 2,8%. Caiu, anteontem, para 0,3%.
Significa que o BC previa um crescimento nove vezes superior ao que imagina agora. Nove vezes. Se quem faz as previsões trabalhasse em uma empresa privada, estaria desempregado e, talvez, processado.
Vamos pôr números absolutos na previsão. Se o PIB é de mais ou menos R$ 1,1 trilhão, um erro de 2,5 pontos percentuais, como o registrado, significa que não se materializou algo em torno de R$ 25 bilhões em bens e serviços produzidos.
Ou, posto de outra forma, a política monetária (juros) se fez em cima de algo que estava muito longe de ser real -e ajudou a causar a paralisia econômica.
Não foi o único erro. Na balança comercial (exportações menos importações), o erro foi de exatos 60% (o BC esperava um saldo de US$ 15 bilhões; deu US$ 24 bilhões).
Em ingresso de investimentos estrangeiros, a mesma coisa: previsão de US$ 16 bilhões, que, na realidade, minguaram para entre US$ 9 bilhões e US$ 10 bilhões.
Só em matéria de inflação o erro foi pequeno (deveria ter sido de 9,5% e acabou sendo de 9,1%).
A explicação do BC é que "o cálculo do produto é, por definição, mais complexo e menos preciso do que o da inflação". Ora, o remédio para manter a inflação sob controle (juro alto, por exemplo) afeta a atividade econômica também por definição. Logo não é razoável aceitar que o responsável pela política monetária despreze tão alegremente a necessidade de ter avaliações muito mais precisas sobre o PIB.
A autonomia do BC só vai fazer aumentar tal alegre desprezo pelo essencial na vida das pessoas (a atividade econômica e, por extensão, o emprego e a renda).



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