São Paulo, terça-feira, 01 de março de 2005

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CLÓVIS ROSSI

Igreja e capitalismo

ROMA - Li com a atenção de sempre o belo artigo que Carlos Heitor Cony publicou domingo nesta Folha, falando bem (muito bem, aliás) da Igreja Católica.
Confesso que, como católico cada vez mais bissexto, tenho bem menos fervor que Cony, mas, crenças à parte, a sabedoria convencional me obriga a reconhecer que uma instituição que sobrevive há 2.000 anos (2005 para ser preciso) é uma potência, independentemente de seus erros -até crimes, que os houve.
Pragmático como fui me tornando crescentemente, assim como, suspeito, boa parte do leitorado, fico me perguntando de onde provém a fortaleza da igreja. Afinal, como já perguntou Napoleão, "quantas divisões tem o papa?". Nenhuma, exceto a Guarda Suíça, que seria absolutamente incapaz de defender o Vaticano de um ataque terrorista (ou mesmo convencional, no pressuposto de que houvesse alguém interessado em invadir o micropaís do papa).
A força da igreja, excluídas as divisões que não possui, só pode vir, portanto, de idéias, conceitos, preceitos e, claro, da fé.
Suspeito que seja justamente esse o desafio para o próximo papa. Idéias e conceitos da Igreja Católica estão crescentemente sendo postos em questão pela ciência, pela cultura ou por ambas. A própria fé parece estar em crise, a julgar pelo decréscimo brutal do número dos que dizem freqüentar a igreja, em toda parte.
Uma coisa é enfrentar o comunismo e ajudar a levá-lo ao colapso, como fez João Paulo 2º. Apoiava-o uma porção considerável da humanidade, a julgar pelo fato de que o colapso foi absolutamente incruento.
Outra coisa, bem mais complicada, é enfrentar as pesquisas com células-tronco. Trata-se, guardadas as proporções, de regressar a um dos combates perdidos pela igreja, contra Galileu Galilei (leia-se ciência).
Ou, posto de outra forma, a igreja está mais ou menos como o capitalismo: venceu claramente o comunismo, mas tem de provar, agora, que é capaz de ajudar a maioria da humanidade a viver melhor.


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