São Paulo, quarta-feira, 01 de maio de 2002

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ANTONIO DELFIM NETTO

Mercosul: esta é a hora

No mundo latino-americano, a Argentina e o México se caracterizaram por terem excelentes escolas de economia -muito antes de as termos organizado entre nós. No final dos anos 40 e início dos 50, estavam mais avançadas e mantinham intensa cooperação com as universidades americanas e européias. Não é de estranhar, portanto, que disponham de bons e imaginativos economistas.
É o caso, por exemplo, do sr. Roberto Lavagna, que agora assume o arriscado cargo de ministro da Economia da Argentina. Formou-se pela Universidade de Buenos Aires em meados dos anos 60 e foi estudar na Bélgica. Isso fala a favor de um entendimento mais correto da realidade argentina do que têm os economistas fabricados em universidades americanas, onde se desenvolve como "ciência econômica" um formidável senso estético...
O sr. Lavagna faz economia política. Em 1996, publicou na "Revista de Comércio Exterior" nš 49 um magnífico artigo, cuja introdução merece ser transcrita: "Se a ciência econômica não conseguiu converter-se em totalmente "objetiva" e depende fortemente de hipóteses e de posições no campo dos valores muitas vezes prolixamente dissimulados, a política econômica não conseguiu, tampouco, deveria dizer, menos ainda, tornar-se independente de interesses concretos. Quando uma determinada política econômica contempla interesses dominantes, será vista e proclamada como "sound economic policy" (política econômica correta). Quando, além disso, ela implica modificação de certas tendências, hábitos ou estruturas do passado, será rapidamente definida como uma "mudança profunda" e até como uma "revolução". Se, adicionalmente, obtém respaldo eleitoral, estamos diante de um "milagre" econômico. No entanto todas essa qualificações, particularmente as duas últimas, têm um alto grau de provisoriedade. Argentina e Chile, no início dos 80, e México pós-Salinas de Gortari/Aspe, no final de 94, são exemplos vivos disso. A Argentina pós-Cavallo caminha para ser outro exemplo. O que até então eram prognósticos, começa a se tornar uma evidência" (em 1996!).
Vale a pena ler o artigo para entender como pensa o seu autor. Ele termina assim: "O Mercosul não foi a causa de problemas em cada um dos países membros, ao contrário, foi e continuará sendo parte da solução de problemas estruturais que adquirem uma nova dimensão em uma economia em processo de globalização".
O sr. Lavagna publicou também, em parceria com o competente e diligente economista do BNDES Fabio Giambiagi, um interessante trabalho -"Hacia la Creación de uma Moneda Común: Una Propuesta de Convergencia Coordinada de Politicas Macroeconomicas en el Mercosur"-, em que reafirma a sua convicção.
Talvez seja este o momento de o Brasil aproveitar a oportunidade para dar uma mão forte à recuperação da Argentina. Deveríamos tomar alguns riscos no setor exportador, pressionar os organismos internacionais e avançar definitivamente na consolidação do Mercosul. O momento é mais do que propício. O ministro Sergio Amaral, o ministro Lavagna e o nosso grande embaixador Botafogo Gonçalves podem ajudar a mudar o quadro desolador que hoje atinge o Mercosul.


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.

dep.delfimnetto@camara.gov.br



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