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DEZ ANOS
Hoje completam-se dez anos
do lançamento do Plano Real,
iniciativa que representou o passo
decisivo para retirar o país de um
quadro prolongado de inflação, depois de diversas tentativas fracassadas. É inegável o engenho com que o
plano, por meio da vinculação dos
preços e salários à Unidade de Referência de Valor (URV), desmontou a
armadilha da indexação generalizada. A promessa de derrubar a inflação a níveis "civilizados" foi cumprida, no que se constituiu em importante marco na história da economia
brasileira. Outras promessas, no entanto, que acompanharam a estabilização monetária, se frustraram.
Domar a inflação não foi suficiente
para promover o crescimento sustentado, tampouco para reduzir de
maneira expressiva e duradoura a
concentração da renda. E, ironicamente, o fator que era apontado pelos criadores do Real como a principal causa do processo inflacionário
-o desequilíbrio das finanças públicas- acabou por agravar-se.
Esses problemas podem ser atribuídos em grande medida ao uso político que foi feito da vitória sobre a
superinflação. Em particular, a excessiva valorização da nova moeda
em relação ao dólar cumpriu papel
importante no momento inicial de
redução drástica do ritmo de alta dos
preços, mas acabou sendo mantida
por tempo demasiado.
O real exageradamente "forte"
trouxe como conseqüência, perfeitamente previsível, a acentuada fragilização das contas externas, expressa
sobretudo na incorrência em volumoso déficit em transações correntes. Isso gerou a necessidade imperiosa de atrair grandes volumes de
capitais externos para preservar o nível das reservas do Banco Central, o
que tornou a economia extremamente sensível aos impactos das crises financeiras internacionais da segunda metade da década de 1990 e
início do novo século.
A debilidade das contas externas
foi o fator decisivo para criar uma rígida resistência à redução da taxa de
juros básica, que se manteve altíssima, em termos reais, por um período prolongado, exercendo forte
pressão sobre os agentes endividados, com destaque para o setor público. Ao lado disso, à medida que se
generalizava a percepção de que
manter o real valorizado já não seria
mais viável, o Estado passou a oferecer ao setor privado mecanismos de
seguro contra potenciais prejuízos
advindos de uma desvalorização.
Essa oferta de "hedge", realizada
por meio da venda de títulos públicos com correção cambial, em conjunto com o aumento do endividamento externo do próprio setor público (sobretudo com o FMI), permitiu adiar o primeiro grande ajuste da
taxa de câmbio até depois das eleições de 1998. O custo, no entanto, foi
alto: tendo concentrado os riscos associados à defesa do real forte, o setor público viu sua dívida elevar-se
abruptamente quando a desvalorização sobreveio, no início de 1999.
Os efeitos colaterais da insistência
no real sobrevalorizado não se esgotaram aí. A transição para o câmbio
flutuante permitiu reduzir a taxa de
juros básica para cerca de metade do
nível real em que se situara nos quatro anos anteriores, mas o patamar
permaneceu muito alto. Assim, para
conter a expansão da dívida pública,
impôs-se um esforço de contenção
de gastos e aumento de receitas.
Uma das faces perversas desse processo foi a contínua elevação da carga tributária -que subiu seis pontos
percentuais do PIB entre 1998 e 2003.
Nesse contexto de juros e carga tributária elevados, a economia mostrou baixo dinamismo, com crescimento médio em torno de 2% ao ano
e desemprego crescente. Desarmar
essa situação, ou seja, combater a
vulnerabilidade externa, reduzir juros, promover o crescimento sustentado, recuperar o emprego e distribuir renda são os grandes desafios
que ainda se apresentam ao país.
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