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CLÓVIS ROSSI
Amendoim torradinho
SÃO PAULO - Para que serve uma via expressa? Para que os veículos andem a velocidades superiores às de
ruas normais, certo? Errado, se a cidade for São Paulo e se a via expressa
for a avenida 23 de Maio, a principal
ligação centro-sul.
A 23 de Maio serve para vender
amendoim torradinho. Já seria absurdo vender amendoim torradinho
nas calçadas ou no canteiro central
de uma via expressa, porque, em tese,
os carros passam "expressamente" e,
portanto, não daria tempo para parar e comprar alguma coisa.
Mas, na 23 de Maio, dois jovens
vendem o amendoim não na calçada, mas no meio do que antigamente
chamávamos de "leito carroçável",
ou seja, no meio da pista supostamente expressa.
Pelo menos entre 18h e 20h, perto
do viaduto que dá na avenida Paulista, os dois estão lá, munidos de seus
fogareiros portáteis e com seus saquinhos de amendoim torradinho.
Pedestres numa via expressa são
uma anomalia, certo? Então como é
que você qualificaria pedestres numa
via expressa e ainda por cima vendendo amendoim torradinho? Nem
pensou nisso, não é? Claro, paulistano engole tudo, acostuma-se com toda e qualquer anomalia.
Amanhã ou depois, tenho certeza,
haverá um carrinho de cachorro-quente no meio da avenida. Afinal,
São Paulo não se gaba de sua diversificada oferta gastronômica? Só
amendoim é pouco.
Depois virá um "drive-thru" do
McDonald's, justamente na pista
mais à esquerda, supostamente a de
mais alta velocidade. O difícil será
realizar o "thru", porque, por mais
que a gente "drive", não anda.
Mais adiante, surgirá uma pizzaria
"delivery" (o cidadão encomenda por
celular e retira dois quilômetros e
muitíssimos minutos depois, quentinha, "ôrra, meu", sem sair do carro e,
claro, sem sair da 23 de Maio).
Também não faltará um café com
internet, pelo menos pra gente saber
quantos quilômetros de congestionamento ainda restam. Ou, quem sabe,
um telão passando filme de caubói
tangendo o gado manso.
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