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ELIANE CANTANHÊDE
O abacaxi do Mercosul
BRASÍLIA - Hugo Chávez chegou
ao poder sobre os escombros das
instituições da Venezuela, soterradas pela concentração da economia
no petróleo estatal e por suas conseqüências: corrupção, desigualdade, falta de investimentos, uma casta que jorrava óleo e dinheiro em
Miami.
Chegou, portanto, como salvador
da pátria, apoiado desde os militares até a esquerda ortodoxa, unidos
por princípios nacionalistas e moralizantes. E tratou de compor um
discurso e sua própria imagem com
um populismo vermelho, ultrapassado e contundente.
Para o Brasil de FHC, Chávez foi
um achado: as indústrias brasileiras
nunca venderam tanto para a rica
Venezuela, os vôos jamais foram
tão lotados. Para o Brasil de Lula,
foi mais do que isso: além do pragmatismo comercial, havia a identidade e a torcida ideológica.
Mas Chávez foi saindo do controle. O fechamento da economia
preocupa, o autoritarismo político
assusta, as agressões aos EUA ultrapassam limites diplomáticos, os
métodos são questionáveis até para
o (ex?) aliado PT e atingem a imprensa. Pior: Chávez passou a competir com o Brasil.
Sua ausência na reunião do Mercosul, na sexta, pesou mais do que
todas as presenças. Mostra o que
ele pode trazer para o bloco, como
insegurança jurídica e regulatória e
divisão dos parceiros, comprando
Argentina, Paraguai, Equador e Bolívia com petrodólares. E não pára
de trazer aviões, fuzis, tanques e,
agora, submarinos russos para o
continente. Para quê?
Quem se der ao trabalho de revisitar as manifestações do Planalto e
do Itamaraty em relação a Chávez
desde 2003 vai constatar uma nítida mudança de tom. Lula saiu da
posição de "irmão", passou para a
de desconfiança, chegou à de evidente falta de paciência e está na fase de contraste aberto, com trocas
de recados pela imprensa. Em suma: cansou. Mas cansou tarde.
elianec@uol.com.br
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