São Paulo, sexta-feira, 01 de outubro de 2004 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Sabotagem, sim
JORGE BORNHAUSEN
Jogar toda a capacidade de aliciamento do governo sobre o Senado para impedir o funcionamento da CPI, como foi feito, não apenas estarreceu o país, mas também alimentou a presunção da sociedade de que o tal Waldomiro Diniz não era um reles chantagista, como mostrou a cena filmada do "Jornal Nacional" em fevereiro. Ele é, para o governo Lula, um condestável diante de cujas façanhas o PT treme de medo. Waldomiro Diniz, na crença geral, é o fio que poderia levar a CPI do Senado a pessoas e fatos altamente comprometedores. O presidente do PT evitou me desmentir, preferiu não enfrentar a questão, pois ficaria encurralado entre aceitar a investigação parlamentar de que o governo e o PT fogem como o diabo da cruz ou admitir que estamos diante de explícita sabotagem à democracia. Na verdade, não se desqualifica a acusação nem se desfaz nenhum dos fatos que apontei com precisão, como a temeridade com que o governo Lula e seu partido traem descaradamente seus compromissos de campanha. Abandonaram não apenas os companheiros, trocando-os pelos seus mais escrachados antípodas ideológicos. Também renegaram princípios éticos, com que envolveram até religiosos ingênuos, hoje perplexos, sem entender o estoicismo desses antigos companheiros que agora só querem saber de ostentação e luxo, associados com quem antes acoimavam de "demônios burgueses"... Nenhum partido acumulou caixinha mais rica. A democracia é um regime construído sobre princípios -o mais notável dos contratos com que já se comprometeram as sociedades-, e nada é mais nefasto à sua estabilidade do que a desconfiança do povo. Daí a acusação que fazemos ao PT, de sabotagem contra a democracia, por haver prometido as reformas e as haver negligenciado. A reforma política, para valorizar os partidos e punir os vira-casacas (que antes o PT detestava e agora cultiva, pagando em moeda corrente, como se viu na denúncia da revista "Veja" que explica o processo infeccioso de crescimento do PTB), já pronta, foi mantida paralisada. A reforma da Previdência resumiu-se a punir os aposentados; a reforma tributária, que prometeu a racionalidade dos impostos, limitou-se a aumentá-los astronomicamente; a reforma da assistência social reduziu-se a uma maquilagem medíocre dos programas já existentes, ao que se adicionaram ralos que facilitam a corrupção, como se viu na transformação do Bolsa-Escola em Bolsa-Família, uma impostura sem limites. A reforma agrária limitou-se a entregar um ministério, de porteira fechada, ao MST e a repassar fundos para o sistema de agitação do grupo radical do sr. Stedile, para quem a democracia, com suas regras, é um luxo detestável que deve ser varrido com invasões violentas e lavado com sangue. Por enquanto ainda há a prorrogação das mentiras através da propaganda enganosa, que celebra uma virada da economia e anuncia um crescimento de 3,5%, sem dizer que o Brasil está crescendo menos que a África -a pobre África, que cresce 5,4%. Menos, principalmente, do que nossos competidores mais próximos, os países emergentes da Ásia, com crescimento de 6,9%. Estamos abaixo da própria média mundial, de 5%. Ou seja, estamos indo na onda de um fenômeno de crescimento mundial e, assim mesmo, a reboque. Nada mais grave, porém, do que o desrespeito à Lei Eleitoral cometido pelo próprio presidente da República na campanha paulistana. Ato da mais pura sabotagem contra a democracia. Jorge Konder Bornhausen, 66, é senador pelo PFL-SC e presidente nacional do partido. Foi governador de Santa Catarina (1979-82) e ministro da Educação (governo Sarney) e da Secretaria de governo da Presidência da República (governo Collor). Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Michel Temer: Democracia e autoritarismo Índice |
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