São Paulo, sexta-feira, 01 de novembro de 2002 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Liberdade ameaçada RICARDO NOBLAT
À sua revelia, o "Correio Braziliense" virou protagonista da recente
campanha eleitoral em Brasília. Foi promovido a essa condição pelo governador Joaquim Roriz e por seus aliados.
Durante as eleições, o governador e seus aliados entraram na Justiça com seis pedidos de medidas cautelares contra o "Correio", para impedir publicação de notícias, e ganharam três. Entraram com 22 pedidos de direito de resposta a notícias e reportagens publicadas; novamente ganharam só três. Para se defenderem das acusações do governador na TV, o jornal e seus principais dirigentes entraram com 16 pedidos de direito de resposta. Ganharam todos. Por fim, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu que a Justiça Eleitoral não tem competência para vetar a publicação de notícias. As 48 conversas grampeadas de Pedro Passos e do seu irmão Márcio permanecem até hoje a salvo do conhecimento público, devido à decisão anterior de um juiz da primeira instância. Diga-se em favor de Roriz que ele não é o único governante que tem sérias dificuldades para lidar com uma imprensa cada vez mais livre e crítica como é a nossa. Porque, se ela não for crítica, não será livre. E, se não for livre, para nada servirá. Mas é bom que se diga também que Roriz é o único governador de uma unidade importante da Federação em guerra sistemática contra um jornal. Nos últimos quatro anos, ele aproveitou solenidades públicas para sugerir aos seus seguidores que parem de ler o "Correio". Ele não se cansa de dizer que o jornal mente sistematicamente a seu respeito e serve aos propósitos do PT. Por mais de uma vez, em reuniões com empresários de Brasília, ele já garantiu que o jornal está quebrado. E insinuou que ajudou a quebrá-lo. Os repórteres do "Correio" penam para obter informações que dependam de órgãos oficiais. A orientação dada, de cima, para toda a administração é curta e grossa: negar informações ao jornal. Na primeira semana de outubro, um repórter de outro jornal foi confundido com um repórter do "Correio" e acabou agredido por seguranças da campanha de Roriz. Nas áreas mais pobres do Distrito Federal, onde o governador colhe a maioria dos seus votos, equipes do jornal já não mais circulam a salvo de perigos. Uma equipe foi expulsa a pedradas da invasão da Estrutural no dia do segundo turno da eleição. Eleitores de Roriz que se reuniram diante da casa dele para comemorar sua reeleição queimaram exemplares do "Correio". Admita-se que o governador tem o direito de não gostar do jornal. E até de aconselhar seus correligionários a não o ler. Roriz abusa, porém, dos poderes do seu cargo quando orienta auxiliares a sonegarem ao jornal informações de interesse público. Abusa também quando contribui para criar um clima hostil contra jornalistas no exercício de sua profissão. E abusa quando ignora as acusações de que é alvo e tenta desqualificá-las agredindo quem as veiculou. Ele não entende que a missão mais relevante da imprensa é fiscalizar o exercício do poder e denunciar irregularidades. Comportamentos como o que Roriz adota parecem cada vez mais fora de moda, pelo menos na face civilizada do Brasil. Infelizmente, ainda prevalece em Brasília, cidade de maior renda per capita do país e de mais alto nível de instrução. E às vésperas da posse de um novo presidente da República. Ricardo Noblat, jornalista, foi diretor de Redação do "Correio Braziliense". Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Roberto Romano: Contra o foro privilegiado dos políticos Índice |
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