São Paulo, sábado, 02 de fevereiro de 2008

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Justiça mais simples

Supremo deveria ampliar uso de novos dispositivos para acelerar o trâmite de processos e coibir as manobras protelatórias

A ABERTURA do ano judicial brasileiro, ocorrida ontem em Brasília, representa também a ocasião para o Supremo Tribunal Federal tomar as rédeas da modernização do Judiciário. É preciso, sobretudo, criar e aplicar fórmulas que levem a uma redução no tempo de tramitação de processos no Brasil.
Nos próximos dias, os 11 ministros do STF discutirão e definirão a pauta do tribunal. É imperativo que escolham casos paradigmáticos, cuja resolução firme jurisprudência capaz de reduzir a absurda demanda artificial à qual as cortes brasileiras estão submetidas. Como observou em artigo nesta Folha Joaquim Falcão, integrante do Conselho Nacional de Justiça, o início do ano judicial "é um momento crucial. É quando o Judiciário deixa de ser órgão passivo, que não pode tomar iniciativas a não ser quando provocado. Deixa de apenas reagir. E age".
Ao longo dos últimos anos, na reforma do Judiciário, o Congresso municiou o Supremo com ferramentas novas para imprimir maior eficácia ao sistema. A corte, entretanto, as vem utilizando com certa timidez.
A mais poderosa dessas armas é o efeito vinculante. Trata-se de dispositivo que permite ao Supremo editar súmulas fixando jurisprudência que deve obrigatoriamente ser seguida pelas instâncias inferiores da Justiça e pela administração pública. Criado em 2004 e regulamentado dois anos depois, o mecanismo só foi utilizado em três ocasiões, nenhuma delas envolvendo conteúdo muito controverso.
Caminho semelhante segue o princípio da repercussão geral, que possibilita ao STF recusar recursos extraordinários e agravos em ações com baixa relevância social, no entendimento da maioria dos ministros. Associadas, a edição de novas súmulas vinculantes e a exclusão das matérias sem repercussão geral teriam o condão de livrar o Judiciário de milhares de processos repetitivos, cujo desfecho já é conhecido de antemão.
Freqüentemente, tais ações são impetradas não com o intuito de buscar Justiça, mas apenas de ganhar tempo. Por paradoxal que pareça, a própria lentidão do Judiciário fomenta uma demanda oportunista, em que o fim último é protelar pagamentos.
Nesse tópico, o Supremo deve figurar como exemplo para outras instâncias, punindo quem se vale desse expediente. Embora pouco utilizados, os instrumentos estão previstos e vêm sendo ampliados pelo Legislativo, que criou ou reformulou meios para coibir litigância de má-fé, embargos meramente protelatórios e recursos manifestamente inadmissíveis. É o caso de aplicar mais amiúde as punições previstas (multa e indenização à parte prejudicada), até que se extinga a cultura de utilizar a Justiça como meio de procrastinação.
A tarefa não é fácil, pois contraria interesses poderosos. São, afinal, o governo (nas esferas federal, estadual e municipal) e um pequeno número de grandes empresas que mais recorrem à demanda artificial e assim atravancam o Judiciário.


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