São Paulo, terça-feira, 02 de março de 2004

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ELIANE CANTANHÊDE

Governo de perna bamba

BRASÍLIA - Os dois dados mais relevantes da pesquisa Datafolha de hoje: Lula está impermeável à crise, mas José Dirceu faz água rapidamente. Enquanto o presidente mantém sólidos 60% de aprovação desde outubro, um percentual ainda maior -quase 70%- defende o afastamento de Dirceu: 24%, o afastamento definitivo; 43%, o temporário.
Isso, evidentemente, é péssimo para o governo. Significa que a opinião pública teve conhecimento da crise, identificou a responsabilidade de Dirceu nos atos do subordinado Waldomiro e agora pede a cabeça de uma das pernas do tripé governista.
Dirceu pode ter mil e um defeitos, a critério do freguês, mas não lhe neguem uma qualidade fundamental: ele tem poder e sabe usá-lo. Tem liderança no Congresso, no PT e entre os demais ministros. Sua queda seria um baque inestimável para Lula.
Um dos momentos mais dramáticos de FHC foi quando, em meio à queda-de-braço entre o que se convencionou chamar de "financistas" e "desenvolvimentistas", ele pensava em aprumar o governo centrando o eixo em Luiz Carlos Mendonça de Barros e André Lara Rezende. A sacudida das privatizações das teles inviabilizou a permanência deles no governo e o projeto de FHC foi para o espaço. Uma perda e tanto.
Agora, o clima é também um pouco esse. Os "financistas" (aqueles que defendem a cartilha de juros e superávits altos) são hoje liderados por Antonio Palocci (Fazenda). Os "desenvolvimentistas" (que têm mais visão política e querem refresco na economia), por Dirceu. Com o chefe da Casa Civil fraco, enfraquecem-se. Até porque a terceira perna do tripé, Luiz Gushiken (Comunicação de Governo), sempre fechou com Palocci.
O momento, portanto, é crucial para Lula e para um governo ainda tão jovem. A crise chegou ao Planalto e atingiu o braço direito político do presidente. Sua alternativa não é das melhores: manter Dirceu é ruim, e tirá-lo também seria. A popularidade de Lula continua alta, mas isso não é tudo. Ainda mais se o projeto de poder é, como o do PT, de longo prazo.


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