São Paulo, terça-feira, 02 de março de 2004

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CLÓVIS ROSSI

Lula e Aristide

MADRI - Juan Jesús Aznárez, enviado especial do excelente jornal espanhol "El País" ao Haiti, escreveu ontem o seguinte no perfil do deposto presidente Jean-Bertrand Aristide:
"Nascido no seio de uma família pobre, expulso da ordem (dos salesianos) porque pregava dos púlpitos a sublevação contra o tirano Jean Claude Duvalier, ganhou em 1990 a Presidência do Haiti quase por aclamação. Foi idolatrado como o Messias encarnado (...) e penetrou nas entranhas de uma sociedade majoritariamente negra, que reconheceu-o como seu: negro e miserável".
Qualquer semelhança com a biografia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva é, por enquanto, mera coincidência. Espero que continue assim, mas, antes que o fundamentalismo petista, enfurecido e cego como anda ultimamente, me acuse de pregar um golpe contra Lula, recorro a uma lição de um dos ideólogos do partido, o ministro da Educação Tarso Genro, que dizia, em artigo publicado domingo por esta Folha:
"A denúncia (o caso Waldomiro Diniz) pode ser extraordinariamente positiva para o PT. Por quê? Porque estamos duramente alertados de que os nossos governos não são imunes a esse tipo de infiltração e porque precisamos, todos nós do PT, estar mil vezes mais atentos às relações que somos levados a travar na nossa ação política cotidiana".
Mil vezes mais atento é necessário, mas insuficiente, caro Tarso. É preciso também ser fiel à própria história, em vez de reescrevê-la depois de chegar ao poder. É preciso respeitar não apenas princípios republicanos (aliás, seria o mínimo a pedir), mas também princípios políticos e idéias defendidas ao longo dos anos.
Lula e Aristide foram iguais na origem. O que aconteceu no Haiti deveria servir de alerta ao brasileiro para que perceba que chegar ao poder não é o fim da história, por linda que essa tenha sido, mas apenas o princípio. O julgamento final virá do que se fizer com o poder, como o demonstra, para o pior, o caso Aristide.


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