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PLÍNIO FRAGA
Palavra não basta
RIO DE JANEIRO - Parece picuinha
cobrar de José Serra agora o compromisso público que assinou há 565
dias, quando provocado se deixaria a
Prefeitura de São Paulo para disputar a Presidência ou o governo do Estado. Naquele 14 de setembro de
2004, Serra titubeou e disse preferir
não assinar: "Minha palavra basta",
afirmou, perante 300 pessoas.
Aceitou pôr seu jamegão no papel
para estancar a "especulação" de que
faria da prefeitura "trampolim" para
outro posto, como acusava seu adversário Paulo Maluf. É duro admitir,
mas é preciso escrever claramente:
Maluf tinha razão.
Não é mera picuinha. Por que, homem racional que é, Serra não se recusou simplesmente a assinar o documento, usando de sinceridade para
dizer que na política as coisas mudam como nuvem, como afirma a sapiência mineira? Por que preferiu se
render ao pensamento marqueteiro
de que a frase poderia lhe tirar votos?
Para ficar num exemplo tucano,
era preferível usar a ranhetice de Mario Covas, com seus óculos fora de
moda e seu temperamento abrasivo,
mas com pendor a ser o que era e a
dizer o que pensava. Perderia alguns
votos, mas enobreceria o currículo.
A palavra de Serra não bastava, o
tempo demonstrou. O tucano inaugurou uma vertente nova da contestada frase "esqueçam o que escrevi",
atribuída a FHC. "Esqueçam o que
assinei", ainda falta dizer Serra, pelo
menos às três centenas de pessoas que
o ouviram afirmar, cara a cara, o que
agora renegou.
Dois dias depois de o tucano ter assinado o compromisso, lembrava
neste espaço que Antonio Palocci Filho fizera o mesmo em Ribeirão Preto, também sem cumprir. Está aí
uma semelhança incontestável de
Serra com Palocci na mixórdia de
identidades entre PSDB e PT, num
péssimo momento de afinidade.
São Paulo convoca Serra para posto
em que pode melhor ajudar o país, o
Estado e o município, argumentam
os tucanos. É, deve ser. Mas Serra permite agora que se diga que a ocasião,
se não faz o ladrão, ao menos açoda o
oportunista.
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