São Paulo, quarta-feira, 02 de junho de 2010

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Quinhentos bilhões

GUILHERME AFIF DOMINGOS


Hoje, o Impostômetro chega à marca de R$ 500 bilhões, mostrando que não há problemas quanto à receita para os governos


O Impostômetro foi criado pela Associação Comercial de São Paulo, em parceria com o Instituto Brasileiro de Direito Tributário, para chamar a atenção da população sobre o peso dos impostos que ela paga, já que o sistema atual não é transparente.
Inaugurado em 20 de abril de 2005, o Impostômetro mostra a arrecadação dos impostos, taxas e contribuições cobradas pelos governos federal, estaduais e municipais. A data foi homenagem a Tiradentes e aos inconfidentes que se rebelaram contra a cobrança, pela Coroa, de 1/5 do ouro extraído no país, ou seja, 20% do total -que era chamado de "quinto dos infernos".
Hoje, a carga tributária representa quase 2/5, uma vez que está próxima dos 40% do PIB do Brasil.
Neste 2 de junho de 2010, o Impostômetro registra a absurda marca de R$ 500 bilhões -22 dias antes que em 2009-, mostrando que não há problemas para o governo quanto à receita, que cresce a taxa superior a 10% sobre o ano passado.
Mas a velocidade da expansão dos gastos vem sendo maior, resultando em aumento da dívida pública e, mais grave, para o custeio da máquina, em vez de investimentos.
Ao contrário do que afirmou a ex-ministra Dilma Rousseff, de que a CPMF foi extinta de um dia para o outro, a sociedade teve que demonstrar forte reação até dezembro de 2007. Vale lembrar que a extinção da CPMF já era prevista na própria Constituição.
O desempenho da arrecadação nos últimos anos mostrou que não era correta a afirmação de que "o país seria ingovernável" sem a CPMF. Também não procede a afirmação da ex-ministra de que, com o fim da CPMF, "houve uma perda da capacidade de fiscalização".
A Receita Federal dispõe de instrumentos para acessar os dados bancários dos contribuintes sempre que necessário, além de uma ampla gama de informações que permitem acompanhar a vida financeira dos cidadãos.
Usar a área da saúde para criar ou aumentar tributo -ou a necessidade de dar instrumentos de fiscalização à Receita- só pode resultar do desconhecimento da realidade ou da intenção de elevar a carga tributária para gastar mais.
A vigência da CPMF mostrou que "dinheiro não tem carimbo" e que aplicar mais ou menos recursos depende do governo, a quem cabe definir as prioridades.
Se faltou dinheiro para a saúde nos últimos anos -e concordamos com isso-, embora existam também problemas de gestão, não foi por falta de receita.
Foi, sim, porque a área não foi considerada prioritária por um governo que se vangloriou de "emprestar dinheiro ao FMI", aumentou gastos com o funcionalismo, criou ou recriou empresas estatais e vem oferecendo crédito para diversos países, em geral governados por ditadores ou populistas.
Esperamos que essa marca de R$ 500 bilhões da receita tributária brasileira, mostrada hoje pelo Impostômetro, sirva para sensibilizar a população de que ela paga muito imposto, portanto, tem o direito de exigir serviços compatíveis e, sobretudo, tem obrigação de fiscalizar como são gastos esses recursos pelo governo.
Somente o contribuinte bem informado e consciente pode exercer plenamente sua cidadania.
Por isso, na Constituinte, incluímos emenda que resultou no artigo 150, parágrafo 5º, da Carta Magna, que determina que o consumidor seja informado de quanto paga de impostos em suas compras.
A necessidade de regulamentação desse artigo resultou em projeto de lei ratificado com 1,5 milhão de assinaturas, já aprovado no Senado, mas que se encontra nas mãos do presidente da Câmara esperando para ser votado. Por que esse projeto não é aprovado? Há medo de revelar a enormidade da tributação brasileira?


GUILHERME AFIF DOMINGOS é vice-presidente da Associação Comercial de São Paulo. Foi secretário do Emprego e Relações do Trabalho do Estado de São Paulo (gestão José Serra).

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

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