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ANTONIO DELFIM NETTO
A "outra China"
O Partido Comunista Chinês desenvolve uma política
de acomodação para manter o
controle interno. E pensa 40
anos à frente para prosseguir
no seu bem-sucedido programa de desenvolvimento.
Testemunhas verazes mostram que na China o debate de
ideias em ambiente fechado
(na academia) é relativamente
livre. A situação muda radicalmente quando a contestação é
pública ou organiza o pensamento dissidente. Até quando
esse mecanismo vai funcionar
numa sociedade cuja afluência cresce a olhos vistos, é uma
questão em aberto.
Sobre o que se tem certeza é
que os recursos naturais da
China não serão capazes de
sustentar a produção de bens
e serviços necessários para
uma população de 1,7 bilhão
em 2050 (se a população crescer à taxa de 0,5% ao ano) com
uma renda per capita da ordem de US$ 71 mil -em dólares de 2009 (se o crescimento
per capita for de apenas 6%).
Isso, grosseiramente, representa quase 1,7 vez o PIB mundial de 2009! Sua simples
menção mostra que, com sua
população e seu "projetado"
crescimento, a China não caberá na China! Não há água,
não há solo, não há energia no
território chinês para sustentá-lo. Ela precisará de outra
China!
É exatamente isto o que ela
está fazendo: transformando
as suas extraordinárias reservas de dólares (mais de US$
2,5 trilhões) em ativos reais.
Compra na América Latina
e na África terras para cultivar
cereais (e eventualmente biocombustíveis) e explorar recursos minerais (minério de
ferro, cobre etc.).
Empresta a empresas petrolíferas com garantia de suprimento. O mesmo que fizeram
as velhas metrópoles nas suas
colônias e no mundo emergente. Mas há uma diferença
importante: a exploração colonial era intermediada por
empresas privadas sob a tutela soberana.
No caso da China, é o próprio Estado soberano que, por
intermédio de empresas estatais, se apropria (pela compra
ou por empréstimo) de ativos
reais em outros países soberanos. É a isso que assistimos
diariamente no Brasil!
Mas por que essa preocupação? Primeiro, porque é duvidoso que isso não viole a nossa Constituição.
Segundo, porque poderá vir a constituir
uma limitação ao exercício de
nossa política econômica, o
que, eventualmente, poderá
gerar graves contenciosos diplomáticos.
E, terceiro, porque, no longo prazo, oferecerá vantagem
comparativa à China, que,
sem intermediação dos mercados, fará uma ligação direta
entre o suprimento e a sua demanda, certamente abaixo
dos preços internacionais e
em prejuízo do país fornecedor colonizado.
ANTONIO DELFIM NETTO escreve às
quartas-feiras nesta coluna.
contatodelfimnetto@uol.com.br
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