São Paulo, segunda-feira, 02 de agosto de 2004

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RENATA LO PRETE

Marta e os visitadores

Com o bombardeio do horário gratuito ainda duas semanas distante, o armamento da hora na sucessão paulistana são os visitadores contratados pela campanha de Marta Suplicy para vender a administração municipal de porta em porta. O cenário de disputa renhida levou o PT a concluir que não bastarão TV, rádio e rua. Será necessário buscar o eleitor dentro de casa.
A novidade não é a abordagem domiciliar, mas sua profissionalização. O visitador recrutado pelos petistas recebe treinamento e remuneração mensal em torno de R$ 500. Segue roteiro preestabelecido de perguntas. A depender da intenção de voto declarada, oferece material de propaganda para potencializar o efeito divulgador.
Há relatos de entrevistados que, tendo listado ao visitador suas principais preocupações, receberam dias depois uma carta informando o que a Prefeitura de São Paulo estaria fazendo nas respectivas áreas. A mensagem "customizada" atende ao mais singelo princípio das transações comerciais: convencer o comprador de que se tem o que ele precisa.
Seriam cerca de 4.000 os visitadores de Marta, cada um encarregado de, no mínimo, 25 portas por dia. Basta multiplicar um número pelo outro para ter uma idéia da capilaridade censitária da operação.
"Televisão é força aérea, mas sem infantaria não se ganha a guerra", resume um experimentado homem de campanhas na tentativa de ilustrar o papel do arrastão petista -ou do "mutirão" tucano, mais primitivo.
Inovadora para os padrões locais, a iniciativa do PT guarda semelhança com programa adotado pela campanha reeleitoral de George W. Bush. Lá, no entanto, já se oferecem bônus aos visitadores que demonstrem excelência em metas como recrutamento de novos soldados, telefonemas a programas populares de rádio e manifestos pró-candidato publicados nas seções de cartas dos jornais.
Nos EUA, o porta-a-porta sempre foi marca registrada do Partido Democrata. Invariavelmente mais ricos, os republicanos costumavam centrar recursos nos dispendiosos spots de TV (não existe horário gratuito).
A equipe de Bush, porém, convenceu-se de que não teria passado sufoco -ou perdido a eleição presidencial, como se queira- em 2000 caso suas forças terrestres fossem mais presentes nos chamados "swing States", onde não há dominação clara de nenhum dos dois partidos. Neste ano, elas estão em campo desde abril.
Em São Paulo, o advento dos visitadores remunerados tem provocado algum saudosismo em relação aos antigos militantes petistas que, munidos apenas de estrela vermelha e entusiasmo, conquistavam votos atribuindo ao governante de turno toda a injustiça deste mundo.
Como no caso dos que aguardam a "guinada" do governo Lula, a choradeira será em vão. Se há algo que o PT aprendeu a fazer é arrecadar dinheiro e organizar campanhas. Não iria recuar no tempo e fazê-las de forma amadora agora que está com a arca cheia. É o casamento da cultura do aparelho com o rigor metódico das pirâmides de vendas.


Renata Lo Prete é editora do "Painel"


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