São Paulo, quarta-feira, 02 de outubro de 2002

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PAINEL DO LEITOR

Transição democrática
"Refiro-me ao artigo de ontem do sr. Roberto Mangabeira Unger ("O dever das oposições", "Tendências/Debates", pág. A3), no qual faz uma alusão a uma possível "mexicanização" da política brasileira. Não é a primeira vez que o professor Mangabeira faz uso dessa expressão, que faz referência à prática dos antigos presidentes mexicanos provenientes do Partido Revolucionário Institucional (PRI) de sinalar seus sucessores e fazer elegê-los. No entanto devo esclarecer aos leitores da Folha que milhões de mexicanos nunca se identificaram com essa prática antidemocrática e lutamos contra ela até que, nas últimas eleições, em julho de 2000, pela primeira vez em 70 anos, houve alternância no poder. Naqueles momentos, o próprio PRI iniciou um processo de reforma, com a realização de eleições primárias. Hoje em dia, para mim, mexicanização quer dizer transição democrática, alternância no poder e vontade de aprendizagem democrática de toda a sociedade."
Cecilia Soto, embaixadora do México no Brasil (Brasília, DF)

Território nacional
"Há tempos, centenas de homens, de mulheres e de crianças do MST, munidas de foices, enxadas e outras "armas" rudimentares, invadiram a fazenda dos filhos do presidente da República. Na ocasião, o Exército foi chamado para defender aquela área do nosso território nacional. Há meses que a cidade do Rio está sob o comando de bandidos, que nos tiraram o direito de ir e vir, de trabalhar e de estudar, além de causarem prejuízos incalculáveis não só na área econômica como também na saúde física e mental de seus cidadãos. Pergunto: o Rio de Janeiro também não é território nacional? Seus cidadãos não merecem o mesmo respeito que os filhos do presidente da República? Serão os sem-terra mais perigosos que os traficantes? Por que o Exército não pode ser de novo convocado? Não sei o que pensar. Só não quero perder a esperança."
Annamaria Di Donato G. Pereira (Nova Friburgo, RJ)

Objeto voador
"Li na Folha de segunda-feira que a soprano Barbara Hendricks interrompeu a apresentação de uma canção de seu concerto de domingo no parque Ibirapuera. O culpado pelo incidente teria sido um helicóptero. Foi exatamente esse objeto voador identificado que me fez parar de ir aos shows no parque. Sempre existe um sobrevoando e atazanando a vida da gente. Cansei, desisti."
José Augusto Lisboa (São Paulo, SP)

Motivo
"Lula é o único motivo para temermos que, apesar de sua flexibilização, o PT ainda não esteja pronto para gerenciar o capitalismo. Ele é um homem hábil, que saiu dos grotões da miséria, venceu na grande cidade, mas se viu elevado a alturas para as quais não estava preparado -a educação formal faz falta, sim. Então, os bem-pensantes do partido trataram de policiá-lo o tempo todo para evitar as suas incontinências verbais ("Argentina é republiqueta", "o erro do socialismo soviético foi a igualdade" etc.), golpeando-lhe a fundo a auto-estima. Pessoas humilhadas e ressentidas não servem, entretanto, para presidente. Podem usar o poder para vingar-se de quem não admitiu sua "genialidade". Só para lembrar: os políticos estrangeiros com quem Lula mais se identifica, Fidel e Chávez, são exatamente dois autoritários avessos à divisão de poderes. Quem garante que o PT conseguirá impedir Lula de atentar contra o Legislativo e o Judiciário na primeira vez em que seus delírios de grandeza forem contrariados? Para piorar, o flerte explícito de Lula com os quartéis parece uma busca antecipada de aliados para ajudá-lo a atingir a democracia. Em suma: Lula, amanhã, poderá ser Jânio, cuja atabalhoada tentativa de golpe precipitou o Brasil em décadas de turbulência."
Celso Lungaretti (São Paulo, SP)

Governos indiferentes
"Não é com cabeça baixa, desesperados e deprimidos, que resolveremos o nosso grave problema de sermos desrespeitados e enganados por governos indiferentes, que mutilaram as nossas aposentadorias ao longo dos últimos anos e que continuam ainda desviando recursos da Previdência Social. Levantemo-nos agora, afinal, contra tamanha injustiça -com a qual não queremos mais conviver! Vamos reagir agora, empregando conscientemente a nossa única e bem poderosa arma em nossa legítima defesa: o nosso voto nas eleições que se aproximam. Não vamos repetir o erro de votar em políticos mais preocupados em incrementar a própria aposentadoria do que na correção das nossas e que permitiram que se chegasse ao atual e desastroso ponto -como é o caso de companheiros que pagaram sobre três salários mínimos e hoje recebem apenas um. Vários casos semelhantes poderão ser relatados por muitos aposentados. Devemos então exercer a nossa cidadania criteriosamente, votando numa nova geração de políticos bem escolhidos, mais competentes e honestos, cujos nomes sejam lembrados para posterior cobrança. Pensem bem: bastam apenas 100 mil votos, em média, para eleger um deputado federal. Unidos, seríamos 19,5 milhões de eleitores, o suficiente para eleger 200 deputados federais, convictos defensores de nossos direitos."
Harro Wender, Grupo de Trabalho de Aposentados pelo INSS (São Paulo, SP)

Obras
"Em relação ao texto "Estudo tem origem suspeita, afirma pepebista" (Eleições 2002, pág. Especial 9, 28/9), gostaria de esclarecer, em primeiro lugar, que a pesquisa em discussão analisou mais de 5.000 estratos de documentos publicados de 1978 a 1998 no "Diário Oficial" do município referentes a obras de infra-estrutura. Os resultados e a metodologia estão publicados em várias revistas científicas e podem ser obtidos no site do Centro de Estudos da Metrópole (www.centrodametropole.org.br). Entre os resultados, está a forte diferença nas políticas públicas de governos de direita e de esquerda retratada na reportagem "Maluf fez obras para ricos, diz pesquisa". Informo que os resultados são confiáveis estatisticamente segundo as técnicas quantitativas usuais e podem ser encontrados nos artigos citados. O governo Maluf apresenta esse padrão no seu grau mais elevado. Governos de direita tendem a ser menos redistributivos, não apenas em obras viárias mas também em pavimentação, em drenagem e em canalização, muito necessárias em áreas periféricas. Além disso, como o Orçamento público é finito, esse padrão de gasto significa um esforço menor em outras políticas. Os programas do governo Maluf citados pelo sr. Adilson Laranjeira podem ter existido, mas os gastos públicos nos indicam que o peso das políticas sociais naquele governo foi muito menor do que nos de esquerda. Essas conclusões não envolvem ideologia, apenas trabalho empírico sólido e lógica formal. Na verdade, as prioridades de governos de direita não são negativas em si, já que lhes foram dados mandatos populares para escolher e executar políticas. O problema está em esconder as suas prioridades, afirmando ao eleitorado que se fez uma coisa quando se fez outra."
Eduardo Cesar Marques, professor de ciência política da USP (São Paulo, SP)



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