São Paulo, sábado, 02 de outubro de 2010

Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

O texto abaixo contém um Erramos, clique aqui para conferir a correção na versão eletrônica da Folha de S.Paulo.

Editoriais

editoriais@uol.com.br

Continuar crescendo

Economia brasileira tem boas perspectivas, mas é preciso aumentar investimentos e a eficiência do Estado para que a expansão do PIB prossiga



Não faz mais de quatro anos, era comum entre economistas a avaliação de que o potencial de crescimento da economia brasileira limitava-se, se muito, a 4% ao ano, num ciclo de curta duração que recebera o apelido pouco elegante de "voo de galinha".
Neste 2010 em que o PIB deve crescer 7,5%, o desalento de meados da década soa como um equívoco remoto. O engano agora parece ser o do excesso de confiança, um empecilho à adoção de providências para reavivar as fontes do crescimento, que ora se esgotam.
Nos últimos quatro anos, o crescimento do PIB terá sido de 4,7%, em média. No quarto de século seguinte ao fim do "milagre econômico", em 1980, a economia crescera apenas 2,3% ao ano.
O aumento da renda per capita, é o maior desde os anos 70. Impulsionado pelo crédito, o consumo das famílias aumenta a uma velocidade 50% superior à do crescimento do PIB. A distribuição da renda do trabalho se torna menos iníqua. Dissemina-se pela sociedade brasileira um sentimento de bem-estar material.
A dívida pública caiu cerca de 30% desde seu pico, em 2002. A taxa de juros real equivale a um terço do que era no início do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. A dívida externa, que parecia um problema eterno, desapareceu por volta de 2006. Inédito na história do Brasil moderno, o país resistiu a uma crise cataclísmica da economia mundial, em 2008-09.
Numa conjuntura internacional favorável à economia brasileira, a demanda e o preço de nossos produtos de exportação dispararam. Estávamos preparados para isso. Além de investimentos em pesquisa e tecnologia de agricultura, minérios e petróleo, que datam do regime militar, o Brasil tornou-se mais produtivo a partir dos anos 1990. Foram fundamentais as mudanças institucionais e regulatórias implementadas pelo governo de Fernando Henrique Cardoso.
Para que a economia continue a crescer, é imperioso investir mais, um aumento progressivo mas importante dos atuais 18% para 25% do PIB. O nível de consumo das famílias, as despesas com investimento e as despesas de governo já extrapolam a capacidade da produção nacional. Precisam ser atendidos pela crescente importação de bens e serviços.
Cresce, com isso, de maneira preocupante, o deficit externo. Para não reduzir o consumo privado e incrementar o investimento é indispensável conter o gasto do Estado, que toma cerca de 37% do PIB e destina apenas 2% a investimentos, como os de ampliação da infraestrutura.
O excesso de impostos combinado com portos, estradas, aeroportos e ferrovias ineficazes ou insuficientes encarece os produtos brasileiros e diminui o potencial de exportação do país. O aumento das vendas é importante para garantir a importação de bens e serviços modernos que aproximem o país da fronteira tecnológica da economia mundial -sem o que não haverá aumento de produtividade e o potencial de crescimento se esgotará.
Problema adicional de um Estado grande e descontrolado é a liberdade quase arbitrária que os governos concedem a suas máquinas arrecadadoras. Uma barafunda de leis, normas e fiscalização inferniza a vida das empresas. As firmas brasileiras estão entre as que mais despendem tempo e dinheiro no pagamento de impostos, além de estarem sujeitas à incerteza jurídico-financeira dos conflitos surgidos da ação opressiva do fisco. Trata-se de um fator grave de ineficiência e um empecilho à inovação empresarial.
Nesse quesito, aliás, o Estado estimula mais a formação de oligopólios e conglomerados tradicionais, por meio de crédito subsidiado, do que promove avanços na área de alta tecnologia.
Na vida das empresas, o governo está presente demais e de menos, pois o setor privado nacional ainda parece incapaz de bancar investimentos de risco e pesquisa inovadora, como aquelas que um dia criaram a agricultura tropical e a prospecção de minérios e petróleo em alto-mar, hoje esteios da economia do país. É preciso aumentar a eficiência do Estado, que deve transferir à iniciativa privada o que faz mal ou não faz, como construir e gerir portos e estradas.
Tornou-se clichê pregar as reformas da Previdência, tributária e do trabalho. É preciso repeti-lo, mas ressaltando que diante de temas tão controversos, a ênfase deveria recair em microrreformas de baixo custo e grande impacto. Note-se, por exemplo, como mudanças inteligentes na lei de crédito imobiliário fizeram deslanchar esse setor, há décadas inerte.
É essencial combater a letargia do conforto propiciado pelo progresso recente. O crescimento não continuará por inércia.


Próximo Texto: São Paulo - Fernando de Barros e Silva: Somos todos iguais nessa noite
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.