São Paulo, Terça-feira, 02 de Novembro de 1999
Próximo Texto | Índice

A GRAXA E A LAMA

Há cerca de seis meses, o ministro Eliseu Padilha escrevia nesta Folha que, depois de dois anos à frente da pasta dos Transportes, podia afirmar que talvez estivesse "no DNER uma das marcas da transparência administrativa do governo." Infelizmente, apesar das tantas sindicâncias abertas para apurar os problemas que ano após ano, por décadas a fio, mantêm o DNER no noticiário político-policial, ainda há mais marcas de manchas do que de transparência nesse órgão da administração federal.
Por obra da investigação da repórter Mônica Bergamo, publicada no domingo passado por esta Folha, acaba de transparecer que uma espécie de graxa enodoa aquele departamento federal. No dizer vulgar de um dos envolvidos no caso, corre "graxa" -dinheiro- nas engrenagens da liberação de pagamentos de dívidas judiciais do DNER.
Os engraxates no caso são os consultores, por assim dizer, que ajudam credores a furar a longa fila de quem tem a receber indenizações, a fila dos precatórios do DNER. Desde que pague aos tais consultores uma comissão nada módica, por volta de 20% dos débitos em questão, um credor que deveria esperar três ou quatro anos recebe seu dinheiro em algumas semanas. A fim de que a manobra ganhe ares de legalidade, o DNER ganha também um desconto na sua dívida. Desse modo, o credor passa à frente de quem não engraxa o bolso dos ditos consultores e sabe-se lá de quem mais.
O diretor financeiro do DNER, homem de confiança do ministro, diz curiosamente que chancela os fura-filas para não confrontar os procuradores do órgão. Os procuradores dizem que o responsável pela burla é o tal diretor. Lobistas ou consultores dizem que na verdade as decisões finais cabem ao ministro. Padilha, por sua vez, afirma que vai processar os que o caluniam e o dizem beneficiário de uma caixinha política, além de anunciar mais uma sindicância. E assim segue a vida no DNER, esse modelo de transparência no governo federal, segundo o ministro Padilha.
Escândalos no DNER são algo tão previsível como rebeliões na Febem e fugas de cadeias lotadas; remendos nessas instituições são igualmente inúteis. Como dizia o verso de Carlos Drummond de Andrade, a mão está suja, é preciso cortá-la.


Próximo Texto: Editorial: ACABAR COM OS BINGOS
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.