São Paulo, Terça-feira, 02 de Novembro de 1999
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Mundo Novo, novo mundo

ELIANE CANTANHÊDE

Brasília - O assassinato da prefeita Dorcelina Folador é um fato político nacional. E dá calafrios.
Não só porque era mulher, mãe, deficiente física, prefeita, petista, militante do MST e tentava "mudar as coisas". Mas principalmente porque ela combatia o crime organizado -e ali ao lado do Paraguai.
Não é surpresa para ninguém que há quadrilhas bilionárias no Acre, no Maranhão, no Piauí e em praticamente todos os Estados brasileiros. A grande novidade é que esses antros estão sendo desbaratados, e os bandidos estão indo parar na cadeia.
Isso só é possível porque gente crédula, honesta e sobretudo valente -como a prefeita Dorcelina- resolveu enfrentar o touro a unha. O seu assassinato a sangue frio soa como o aviso macabro de que os touros estão reagindo. Não estão aí para brincadeiras nem vão se entregar tão fácil.
Esse medo é crônico no Rio e em Alagoas e está agudo no Acre, no Maranhão e no Piauí, onde a faxina tem sido mais eficaz, mais divulgada e mais comemorada pela imprensa nacional. Agora, bate em cheio em Mato Grosso do Sul. Todo cuidado é pouco.
O crime organizado se sustenta num círculo muito semelhante de norte a sul: entra despudoradamente na polícia, nomeia aliados em cargos executivos, inventa candidatos a mandatos legislativos, corrompe setores da imprensa local e se infiltra na própria Justiça que deveria condená-lo.
Políticos, juízes, promotores, jornalistas e policiais que têm coragem suficiente para entrar pelo outro lado nessa guerra enfrentam, primeiro, o corporativismo e, depois, o risco de vida. Precisam, portanto, de retaguarda e proteção. É o mínimo que o Estado e a sociedade devem a eles. Do contrário, todo o trabalho terá sido em vão.
Dorcelina era prefeita de Mundo Novo e trabalhava efetivamente por um novo mundo. Mas não precisava ser mártir nem deixar órfãs suas duas filhinhas, de 4 e 8 anos.
O pânico está instalado, e é federal.


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