São Paulo, quinta-feira, 02 de novembro de 2006

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A mesma conversa

Embate simplista sobre política econômica mal disfarça falta de idéias, planos e quadros para incentivar o crescimento

"A CÚPULA do PSDB, reunida ontem em Brasília, decidiu unificar o discurso para tentar impor mudanças na política econômica do governo no segundo mandato de FHC." Assim uma reportagem da Folha narrava, em novembro de 1998, um dos capítulos da novela de especulações que antecedeu o início da segunda gestão de Fernando Henrique Cardoso.
Então, como agora, o assunto era com freqüência reduzido à anteposição alegórica entre "desenvolvimentistas" e "monetaristas". Exatamente como ocorre hoje, o questionamento se baseava num anseio legítimo: abrir espaço na agenda nacional para ações de incentivo à expansão do emprego e da produção.
Há oito anos, o debate se perdeu quando ficou claro que era um mero pretexto, manipulado por grupos que se engalfinhavam por nacos do poder -e foi sepultado no início de 1999, quando desmoronou a política do real forte. O modo simplório como a questão vem sendo tratada, agora, por fatias do governismo lulista indica que a história tende a se repetir.
O ministro Tarso Genro (Relações Institucionais) anunciou com pompa "o fim da era Palocci". Mesmo sem definir o que teria sido a era Palocci, o palavrório gerou celeuma e reação imediata no círculo presidencial. Lula em pessoa desautorizou o ex-prefeito de Porto Alegre.
A movimentação de um grupo petista com o objetivo aparente de desestabilizar as chances de permanência, no segundo mandato, da atual chefia do Banco Central redespertou os fantasmas de sempre no "mercado" e seus porta-vozes. Passaram imediatamente a tachar de "gastadores" os petistas que empreendiam essa cruzada contra Henrique Meirelles.
Nessa querela, sobra apetite por poder e faltam idéias, planos e quadros. Não se deve levar a sério quem, nos bastidores, promete o paraíso da queda dos juros básicos, como se eles pudessem despencar de chofre. Não podem. Podem cair com maior ou menor velocidade, a depender das condições objetivas da economia, de ajustes em parâmetros da política monetária e do perfil de seus gestores.
Há margem de manobra, mas ela é muito mais estreita do que tais prestidigitadores querem fazer crer. Não se trata de guinadas, de inflexões, mas de reacomodações e ajustes finos nos termos vigentes. Não se trata de afastar da condução da política pessoas alinhadas a determinada escola de pensamento, mas de favorecer o arejamento gradual e negociado de idéias, quadros, regras e procedimentos.
Trata-se, enfim, de um acordo complexo, cuja operação política é delicada. A conseqüência inexorável de qualquer manobra brusca e tosca como a que se ensaiou será a manutenção da política econômica nos exatos termos em que tem sido conduzida. Essa política, ao reforçar o poder de compra de milhões de famílias brasileiras, foi um dos motivos da reeleição de Lula. Mas ela está sufocando a produção e o emprego num nível que ameaça as conquistas até aqui obtidas.


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