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RUY CASTRO
A Mulher de Branco
RIO DE JANEIRO - Vejo-a todos
os dias. Chama-se Ana Maria -ou
Annamaria, como no título da bossa
nova em sua homenagem-, mas
em Ipanema todos a conhecem como a Mulher de Branco. É como
desfila o ano inteiro, na praia ou no
calçadão, em qualquer estação: com
um microbiquíni branco, no máximo coberto por uma calça de gaze,
também branca e transparente.
A pele, grossa de sol e sal, lembra
a cor e a textura de velhas malas de
couro. O corpo não tem um grama
de gordura, embora, dizem, sua dieta consista em batata frita, refrigerante e biscoitos, e sempre nos
quiosques do Posto 9 -impossível
imaginá-la num restaurante, consultando o cardápio.
Suas fotos dos anos 60, que às vezes ressurgem em arquivos, revelam a morena bonita, voluptuosa e
cheia de corpo, crooner do conjunto brasileiro às vésperas do megassucesso internacional. Hoje, os cabelos tingidos de louro, o rosto de
feições enfáticas e as pernas finas
contam uma história diferente, de
muitas viagens pelas esferas, nas
praias da Califórnia e da Bahia.
Por um breve tempo, ela conheceu a glória dos palcos, hotéis de luxo, voos em primeira, portas que se
abriam e homens que se atiravam.
Os atalhos químicos, no entanto,
cortaram essa trajetória antes que o
sucesso bafejasse seus amigos em
escala inimaginável. Quando esse
sucesso chegou, ela já não estava
com eles, nem em nenhum lugar
discernível.
Há meses, sempre que passo por
ela, a Mulher de Branco está falando com grande animação ao celular.
Planeja sua volta às luzes, aos palcos, à bossa nova. Mas é um celular
imaginário, feito apenas com os dedos. A volta, as luzes e os palcos
também são imaginários. Mas, e
daí? Todos gostam dela em Ipanema. Seu prazer em viver, em se sentir amada e protegida por seus fantasmas, é real.
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