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O Brasil deve restringir a propaganda de cerveja?
NÃO
É preciso mudar o foco
MARCOS MESQUITA
JÁ HÁ algum tempo se vem discutindo a necessidade de impor restrições legais à propaganda de cervejas. Esse assunto se intensificou
agora, em razão de um novo projeto
de lei de autoria do governo federal
remetido para tramitação em regime
de urgência no Congresso.
De nossa parte, sabemos que restringir o horário dos anúncios das
cervejas na televisão não é a medida
correta nem adequada se o que se espera é a redução dos conhecidos males sociais decorrentes do consumo
nocivo de bebidas alcoólicas.
A questão principal, obviamente,
não está em sermos contra ou a favor
da restrição de horários da propaganda de cervejas, mas em ver o que podemos esperar de benefícios com essas restrições.
De fato, a sociedade espera por
ações firmes, que combatam as raízes
de conhecidos males, como o consumo precoce por crianças e adolescentes, o uso ilegal por motoristas e a ingestão excessiva em qualquer idade e
ocasião. Nesses casos, julgamos ser
muito mais adequada a opção por estabelecer campanhas educativas e fiscalizações efetivas das leis existentes.
Diferentemente do que se acredita,
a propaganda não tem nenhum efeito
sobre o consumo total de qualquer
produto. O objetivo das cervejarias é
simples: captar para sua marca a
maior parcela possível da demanda
preexistente para essa categoria de
bebida alcoólica. Para conhecer o
consumo potencial do produto, é apenas necessário conhecer o mercado e
suas duas variáveis fundamentais:
renda disponível para consumo e nível de preço dos produtos.
O aumento da renda das famílias
nos últimos três anos no Brasil e os
preços relativamente estáveis que as
cervejarias conseguiram manter nesse mesmo período, por si sós, explicam o aumento no volume de venda
de cerveja.
Confirma essa regra um passado
recente, entre os anos de 1996 e 2002,
quando havia uma grande presença
de propagandas de cervejas nas emissoras de TV e os volumes vendidos da
bebida ficaram estagnados ou caíram.
É só olharmos para a queda da renda
real das famílias naquele período que
teremos a explicação do porquê de o
consumo de cervejas naquela época
não ter crescido.
As cervejarias, no entanto, têm um
motivo mais que justo para investir
pesadas somas na publicidade de seus
produtos: a necessidade de diferenciar suas marcas em relação às demais marcas concorrentes do mercado e, com isso, reforçar a fidelidade de
seus consumidores, além de despertar interesse na mente dos consumidores de outras marcas, que tendem,
cada vez mais, a ser menos fiéis às
suas escolhas anteriores.
Um mercado de massa que passa a
ter restrições de acesso aos meios de
comunicação comercial não deixa de
ser um mercado de massa, mas torna-se um mercado de baixo valor agregado. Aumenta-se, portanto, a oferta de
produtos de baixo preço e de baixa
qualidade, o que gera um mercado
ainda maior em volumes, embora menor em receitas.
Dessa forma, o que resta é apenas
uma grande frustração para aqueles
que acreditavam na redução significativa do consumo nocivo por meio
de uma (improvável) redução do consumo total dos produtos. Não se atinge, portanto, nenhum dos benefícios
que todos nós gostaríamos de obter.
A sociedade brasileira, no entanto,
já encontrou o meio mais correto para o controle da propaganda no país,
por meio do Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária). Na questão da regulamentação
da propaganda de cervejas, o Conar
tem cumprido um importante papel
de acordo com as demandas da sociedade brasileira em relação à adequação do conteúdo das mensagens.
Sempre que há excessos, mesmo
involuntários, o processo instituído
pela auto-regulamentação age de forma rápida e eficiente, o que não seria
possível por meio de qualquer processo que se baseie em uma lei formal.
É preciso ressaltar que, infelizmente, sem campanhas de educação para
o consumo responsável e a fiscalização adequada das leis existentes, pouco conseguiremos fazer para a redução dos conhecidos problemas acarretados pelo consumo nocivo, inadequado e abusivo de bebidas alcoólicas.
MARCOS MESQUITA, 53, formado em direito e em administração de empresas, é superintendente do Sindicerv
(Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja).
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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