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RUY CASTRO
Quatorze minutos de eternidade
RIO DE JANEIRO - Entre a hora
presumida de entrada do Airbus
A330 da Air France na zona de turbulência sobre o Atlântico e a última mensagem enviada pelo equipamento do avião, na noite de domingo, passaram-se 14 minutos. Se fosse só isso, já seria aterrorizante.
Mas o tempo de apreensão, angústia e pavor a bordo pode ter sido
ainda maior para os 228 passageiros e tripulantes.
É tempo de sobra para que, diante da iminência de morte, a vida
-tudo que se fez e se disse, ou o que
deixou de ser feito ou ser dito- passe várias vezes pela cabeça de uma
pessoa, com uma definição de cinema. E com uma crueldade de Juízo
Final, porque não há mais tempo
para dizer ou fazer o que faltou.
Entre os que conseguem se manter íntegros em tal situação, há
quem tente vencer o abismo rabiscando algo às pressas, descrevendo
o avião em queda ou a aproximação
das chamas, despedindo-se de parentes ou namorados, ou tentando
deixar uma reflexão mais profunda.
É uma tentativa desesperada de comunicar-se pela última vez, de fazer com que sua voz seja ouvida depois do nada.
Sabemos disso porque fragmentos dessas mensagens costumam
ser encontradas em destroços de
aviões caídos em terra. É por esses
retalhos calcinados que nos damos
conta de que o drama pessoal de cada vítima de um acidente aéreo é
maior do que a fria estatística da soma dos mortos no mesmo acidente.
Na tragédia do voo AF 447, comovemo-nos com o casal rumo à lua-de-mel em Paris e com o alemão
que iria tratar dos papéis para se casar com uma brasileira. Mas havia
também empresários, professores e
executivos, que viajavam a negócios, a estudos ou para receber prêmios -enfim, para um luminoso futuro próximo. E outros cujas histórias pessoais, talvez riquíssimas,
nunca chegaremos a conhecer.
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