São Paulo, terça-feira, 03 de agosto de 2004

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CARLOS HEITOR CONY

Imprensa e Judiciário

RIO DE JANEIRO - No seminário sobre a reforma do Judiciário realizado semana passada na Associação Comercial do Rio de Janeiro, a convite de Marcílio Marques Moreira fui fazer uma palestra sobre as relações da imprensa com o Poder Judiciário. Evidente que não era o jornalista mais indicado para a função, mesmo assim procurei dar o meu recado a respeito da principal causa de atritos entre as duas instituições.
Por natureza e necessidade, a imprensa tem pressa, é um produto condicionado pelo tempo, pelo imediato, enfrenta a concorrência de outros veículos de comunicação de massa e adota, como uma de suas principais referências, a necessidade de ser a primeira a dar a notícia, se possível com exclusividade. Numa palavra, no furo, praticando aquilo que gosto de chamar de furolatria.
Assim como a imprensa é merecidamente acusada de superficial e ligeira, o Judiciário se situa em tempo oposto, também por natureza e necessidade.
Em linhas gerais, o Judiciário se obriga a executar as três operações da mente da lógica aristotélica: a apreensão, que é dada pela polícia e pela sociedade em geral; o raciocínio, que é definido pelo equipamento de leis em vigor (Constituição, códigos, leis etc.); e finalmente pelo juízo, que é sua função específica, confrontando a apreensão com o raciocínio. Isso leva tempo.
Já a imprensa realiza sozinha as três operações ao mesmo tempo. Apura os fatos (apreensão, sem dispor da tecnicidade e do poder de investigação do aparelho policial); raciocina (confrontando o fato apurado não apenas com a lei, mas com as circunstâncias de um dado momento); e julga, ou seja, emite uma opinião, uma espécie de sentença que geralmente é mais severa e letal do que a sentença do Judiciário
Dificilmente chegarão ao mesmo resultado. Collor foi condenado pela mídia. E foi absolvido pela Justiça por falta de provas.


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