São Paulo, sexta-feira, 03 de outubro de 2003 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Por fora, bela viola
ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE
Ou seja, usando o mesmo modelo, o Brasil, com a confirmação desse projeto, deixaria de exportar 200 milhões de litros de álcool por ano. Em dez anos, seriam R$ 2 bilhões (a R$ 1 o litro do álcool), que devem ser comparados com os R$ 100 milhões que despenderia a "generosa" Alemanha, se for efetuada pelo Executivo nacional a proposta defendida pelo eminente secretário. Haverá, por certo, outras maneiras de a Alemanha realizar suas compras de indulgências ecológicas. Poderá reintroduzir o fogão a lenha, uma dessas tecnologias apropriadas profetizadas pelo nosso Ministério da Ciência e Tecnologia. Ou, como auspiciava o saudoso ministro Cezar Cals, de Minas e Energia, usar titica de galinha para produzir por fermentação anaeróbia o gás metano -que, em última análise, provém de fotossíntese e, portanto, não contribui para o efeito estufa. Mas é pouco provável que outra solução mais econômica que o uso do etanol seja encontrada. E, nessas condições, talvez mais valham 20 pombas voando (voando baixo, porém) do que uma na mão, pois essa é a relação custo/beneficio que está incorporada na proposta em questão. Mesmo porque esse é um setor que possivelmente encontrará menos resistência no mercado da União Européia para rompimento de barreiras para importação de produtos agrícolas. Em primeiro lugar, porque o álcool brasileiro substituirá derivados de petróleo importado e não interferirá com os poderosos lobbies de agricultores e da agroindústria lá existentes. Em segundo lugar, porque há hoje uma sólida aspiração conservacionista e mesmo de autopreservação na Europa -principalmente na Alemanha. Basta lembrar os 2.000 mortos de calor neste ano na França, as inundações na Alemanha e na Polônia, os estragos do fenômeno climático denominado El Niño etc., que, corretamente ou não, vêm sendo atribuídos ao efeito estufa. Além do mais, o projeto de "gorjeta ecológica" da Alemanha é um artifício para burlar o espírito do Protocolo de Kyoto, que pressupõe que cada país inicie um esforço próprio de conscientização conservacionista, e não que venha a subornar um país carente para que este realize o sacrifício formal, enquanto o rico continua sua progressão poluidora. Rogério Cezar de Cerqueira Leite, 71, físico, é professor emérito da Unicamp e membro do Conselho Editorial da Folha. Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Rachel Moreno: Mais uma eleição Índice |
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