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São Paulo, quarta-feira, 03 de dezembro de 2003

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CARLOS HEITOR CONY

Canções do exílio

RIO DE JANEIRO - Uns dias entre Paris e Lyon, encontro e reencontro amigos que se auto-exilaram nos anos de chumbo e por lá ficaram, em parte porque se adaptaram, em parte porque desconfiam de um revertério que pode fazer o trem andar para trás.
Prisioneiros políticos, exilados e auto-exilados pagam um preço à desinformação e à apreensão de uma realidade inexistente. Na prisão, dorme-se cada noite com dois sentimentos contraditórios: de que, no dia seguinte, seremos fuzilados ou de que seremos chamados a tomar o poder pelo povo que finalmente descobriu que estávamos certos e somos indispensáveis ao progresso e à paz da nação.
No exílio, a alternativa não chega a ser tão dramática ou cômica, mas prevalece um estado de espírito datado, dos tempos em que as circunstâncias nos obrigaram a provar "as uvas ácidas da ausência" -para lembrar o verso de André Eloy Blanco.
Amigos e conhecidos perguntam pelas novidades. Acreditam que a direita está impedindo Lula de governar, criando-lhe embaraços e lançando cascas de banana em seu caminho redentor.
Não é fácil explicar que as coisas não estão claras ideologicamente, que não existe no país um único representante da direita, com exceção do meu amigo Olavo de Carvalho. Até certo ponto, a visão maniqueísta dos brasileiros ali radicados por motivos políticos é fruto de um contágio: na França, não houve um único colaborador, todos foram resistentes, todos pegaram em armas contra os nazistas e dinamitaram as estradas de ferro para evitar os deslocamentos das tropas de ocupação.
Assim também ocorreu com o Brasil. Todos foram contra o regime militar, somente os empedernidos conservadores, áulicos de Washington, dilaceraram a democracia e o progresso do nosso povo. E continuam atuantes, donos dos canais do verdadeiro poder, impedindo que Lula se torne o presidente que todos esperavam e mereciam.


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